Loreta Colucci e a hora certa de voar

Com produção musical de Maria Beraldo, “Antes Que Eu Caia”, primeiro disco da artista paulistana, equilibra experimentalismo e tradições da música brasileira

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Fotos: Sofia Colucci

Antes Que Eu Caia, primeiro disco da artista paulistana Loreta Colucci, quase se chamou “Gole Seco”, mas, nos últimos instantes, ela decidiu seguir outro caminho. O registro, lançado em 31 de agosto, foi criado com apoio de edital do ProAC e tem produção musical assinada por Maria Beraldo. O próximo show marcado será nessa quarta-feira, 25/10, no intimista Bona, em São Paulo.

“O título é sonoro, mas depois entendi o seu significado. O disco aconteceu antes que eu caísse no lugar de achar que ainda não era a hora certa. Ficasse no loop de deixar para depois por falta de coragem ou continuasse me julgando”, explica em entrevista ao Monkeybuzz.

O primeiro verso da faixa que abre o trabalho, “Pó”, também é representativo por ter sido extraído da sua primeira composição, escrita na adolescência, além de ser a faixa que ajudou a nortear a sonoridade das músicas. “Ela não é tão estranha, mas, ao mesmo tempo, tem essa novidade. Você ouve o quarteto de cordas, mas ele não está tocando notas longas, como em ‘Amando Longe’, há uma cutucadinha. Ou como a Maria costuma falar: chegamos com o pé na porta”.

“O título [Antes Que Eu Caia] é sonoro, mas depois entendi o seu significado. O disco aconteceu antes que eu caísse no lugar de achar que ainda não era a hora certa. Ficasse no loop de deixar para depois por falta de coragem ou continuasse me julgando”

A formação de violinos, viola e violoncelo se mantém em quase todas as faixas, com algumas exceções de instrumentos adicionais, além de participações de Jadsa e Anná nos vocais. Uma das referências foi o álbum Vestida de Nit (2017), da compositora catalã Sílvia Pérez Cruz, confirmada no Sesc Jazz no final do mês em São Paulo.

“Tivemos muitas conversas, a gente estava alinhada em não querer o lugar tradicional dos arranjos de cordas, mas sim flertar com o pop e com uma coisa levemente estranha, ainda que cativante. Uma estranheza que instiga a pessoa a se aproximar”, reflete sobre o processo com a produtora.

As mexicanas Natalia Lafourcade e Silvana Estrada também a inspiraram, mas além delas, a violinista Wanessa Dourado e a própria Maria Beraldo – no solo Cavala (2018) e no Quartabê. Adicione a essa mistura o forró de Dominguinhos e o samba de Alcione e Elza Soares, presente em “Não Me Chama Pra Trampar” e “Arte de Me Enganar”. “Busco um diálogo entre o tradicional e o moderno. A Maria também tem uma pesquisa forte de samba e choro”.

Formada em canto popular na faculdade Santa Marcelina, Loreta integra o Grupo Biê com o violonista Luca Frazão e o baterista João Rodrigues, cujo repertório é de samba e bossa nova. Já o Mano Única investiga as conexões entre os ritmos latinos e os brasileiros. O Cordão Cheiroso é um pequeno bloco de carnaval na Lapa, mas que, nos últimos anos, reuniu mais de cinco mil foliões.

“Busco um diálogo entre o tradicional e o moderno. A Maria [Beraldo] também tem uma pesquisa forte de samba e choro”

Como projeto de conclusão de curso, ela concebeu o que se tornaria o grupo vocal Gole Seco, que divide ao lado de Niwa, Giu de Castro e Nathalie Alvim. “A gente nem era amiga na faculdade, eu as convidei porque elas são fodidas, queria gente que cantasse muito”, lembra.

A investigação por texturas, silêncios e timbres foi o embrião do disco solo e do primeiro disco do quarteto, gravado com apoio do ProAC, e que entrou nas plataformas em 19 de outubro. O lado A com cinco faixas, incluindo “Sal” composição de Loreta, saiu em 28 de setembro.

“Tudo começou com o Gole Seco, de pensar outras possibilidades para as estruturas das composições e dos arranjos, e buscar outros caminhos sensíveis”, afirma. Inclusive, a música homônima, criada em parceria com a baiana Jadsa, está nos dois discos. “Vai ser nome do disco ou do grupo? A gente tentou outras ideias, língua, não sei o quê, ficou péssimo. Deixamos assim e escolhi Antes Que Eu Caia. Isso aconteceu muitas vezes enquanto fazia os discos, optar por algo, entender a razão dessa decisão e como essas coisas significam muito”, pontua.

O próprio ato de compor representa uma oportunidade de se autoconhecer e se acolher. Para a cantora, isso faz parte de um movimento de reflexão: “Vejo como uma possibilidade de gerir um incômodo, curiosidade ou sensação. Entender se tem algo me importunando é terapêutico. Componho e fico escutando. Aquilo borbulha dentro de mim, eu boto para fora, ouço e canto”.

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