O mago por trás das mesas

Uma conversa com Josh Rogosin, engenheiro de áudio que faz mágica na série Tiny Desk Concerts

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Fotos: NPR Music

Josh Rogosin começou sua trajetória na NPR, gigante de comunicação dos Estados Unidos, nos idos de 1999. Na época, o engenheiro de áudio mixava apresentações do Shakespeare Theatre, em Washington, e, com o passar dos anos, assumiu o controle dos principais programas da NPR. Até, enfim, aterrissar em uma mágica escrivaninha, localizada em uma espécie de livraria, que, desde 2008, recebe músicos e bandas para shows intimistas.

Nosso herói gravou e mixou mais de 600 performances da série Tiny Desk Concerts – e fez questão de me corrigir quando eu, desatualizado, mencionei um número com 100 apresentações a menos. O projeto idealizado por Bob Boilen, apresentador do programa All Songs Considered, e pelo editor Stephen Thompson nasceu após uma ida frustrada a um bar no qual era impossível escutar o músico tocando. Um mês depois, a cantora Laura Gibson gravou aquele que se tornaria o primeiro Tiny Desk Concert.

De lá para cá, a lista aumentou e se diversificou de maneira impressionante. De Adele a Blue Man Group, de Tyler, The Creator a Sting, de Christian Scott a Paramore, de Rodrigo Amarante a Lizzo. De Taylor Swift a Wu-Tang Clan. Se tem um lugar musical democrático na internet, esse lugar é o Tiny Desk. Mas, mesmo com a variedade imensa de nomes que já passaram por lá, todas as apresentações definitivamente têm algo em comum: o som impecável. A qualidade do áudio do Tiny Desk é melhor do que a de muito álbum de artista tarimbado por aí e conta com um trabalho de gravação e mixagem sempre afiadíssimo. E o culpado disso tudo se chama Josh Rogosin.

Conversei com o mago dos sons e ele revelou um pouco de seus segredos, listou (de cabeça) suas performances preferidas e ainda contou sobre como o Tiny Desk pretende lidar com a quarentena.

 

Você já gravou e mixou mais de 500 performances no Tiny Desk. Existe um padrão ou cada show/gênero pede um tipo diferente de técnica?

Mais de 600 agora! Cada dia é um novo dia. E cada show é um desafio diferente. Uma configuração “simples” pode consumir um tempo grande de mixagem, caso não seja gravado apropriadamente. O desafio mais comum entre as diferentes apresentações normalmente é fazer com que o som da bateria não saia nos microfones dedicados aos vocais. Não há como “emudecê-las” na produção e todos estão muito próximos durante a gravação. O baterista tem o trabalho mais difícil, porque ele precisa tocar de tal maneira que soe dinâmico, mas silencioso o bastante para que seja possível escutar os vocais acusticamente no local.

Qual foi a sessão com mais canais gravados simultaneamente?

A apresentação com mais canais provavelmente foi a do Red Baraat. Coloquei um gravador portátil próximo ao baterista, Sunny Jain, além de alguns microfones espalhados entre o caminho do salão verde [ao lado do local de gravação] e a mesa. E ainda um set inteiro atrás da mesa. Foram mais ou menos uns 20 canais no total, mas eu sempre tento limitar esse número a 16.

As formas de assistir ao Tiny Desk variam: celular, laptop, com ou sem fone de ouvido… Como você lida com essa ideia na hora de mixar?

Eu faço uma mixagem “rascunho” de todos os shows do Tiny Desk em um fone de alta qualidade no mesmo dia em que gravamos, enquanto a apresentação ainda está fresca na minha cabeça. Então, escuto durante as semanas seguintes em diferentes contextos e aparelhos: no meu trajeto ao trabalho caminhando e ouvindo em AirPods; cozinhando, enquanto escuto a performance em uma caixa de som Bose Bluetooth; tomando banho, em uma caixinha de som da Sonos. E no meu IPhone conectado a caixas de som – me perguntando “estou conseguindo ouvir o baixo?”. Já escrevi artigos sobre fones de ouvido e smart speakers para a NPR.

O retorno é feito via fone (in-ear), ou às vezes por monitores (speakers)?

Nós não oferecemos monitores para as bandas. Eles precisam se ouvir naturalmente, algo que às vezes é feito pela primeira vez por muitas das bandas que passam por lá.

Qual instrumento exige mais cuidado para que o áudio saia perfeito?

O baixo é o instrumento mais delicado nesse sentido, especialmente caso você queira ouvi-lo em alto-falantes pequenos. Na pós-produção, eu tento sempre achar frequências que o acentuem de tal forma que ele desponte na mixagem. É o caso da performance do Thundercat com o Mac Miller.

Um conselho para quem quer trabalhar com engenharia de áudio…

“Use your ears and forget about the gear”. Use seus ouvidos e esqueça dos equipamentos. A coisa mais difícil a se fazer para que uma mixagem fique perfeita é saber tomar as decisões sobre os níveis – quando você deve precisamente aumentar ou diminuir a fim de que tudo soe totalmente natural, mas aprimorado.

Deve ser difícil de escolher, mas vamos tentar: quais são suas performances favoritas no Tiny Desk?

Eu tenho muitos favoritos, mas aqui vão alguns que surgem imediatamente na minha cabeça: monsieur Perine, Ssingssing, H.E.R., Snoh Allegra, Snarky Puppy, Mac Miller, IDLES, Mac Miller, Jacob Collier, Lianne La Havas, Daniel Caesar, Go Go Penguin, Joey Alexander, Chicorea And Gary Burton, Chika, Anderson .Paak, Pj Morton, Nick Hakim, Wolf Alice, Andy Shouf.

Anderson .Paak e Josh Rogosin. O show de .Paak é o mais visto da história do canal, com mais de 46 milhões de views.

Como vocês estão lidando com a quarentena?

Nós gravamos cerca de 20 sessões antes de começarmos a trabalhar de casa. Ainda vamos publicar essas apresentações, em média, uma vez por semana. Então, acabamos de começar uma série chamar Tiny Desk (home) Concerts, que terá novos vídeos de 2 a 3 vezes por semana. Vou lapidar o áudio, mas, obviamente, o som não vai soar como sempre. Eu também trabalho como engenheiro na NPR News Magazine, então posso ir até lá caso seja necessário.

Foto: Megan Thee Stallion sob os olhos e ouvidos atentos de Josh Rogosin.

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