Tangolo Mangos em experimentações solares

Com canções compostas durante os últimos cinco anos, “Garatujas”, disco de estreia do grupo soteropolitano, mistura rock clássico, MPB, música regional nordestina e psicodelia

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Fotos: Ricardo Dantas

Enxergar o significado na junção entre a vida e a arte – é a partir dessa ideia que a banda soteropolitana Tangolo Mangos reverbera suas canções no disco de estreia Garatujas (2023), lançado em dezembro do ano passado. O grupo, formado por Bruno Fechine (vozes e percussões), Felipe Vaqueiro (vozes e guitarra), João Antônio Dourado (bateria), João Denovaro (vozes e baixo) e Pedro Viana (vozes e guitarra), traz uma atmosfera tropical que flerta com o rock clássico, a MPB, a música regional nordestina, além de carregar uma estética ligada à psicodelia. “No geral, o objetivo do disco foi progredir com a qualidade sonora das músicas, mas mantendo a identidade da banda e principalmente tentando explorar um pouco mais a melhor versão dos Tangolo Mangos que, na minha opinião, é a versão ao vivo da banda. Conseguimos capturar isso em algumas músicas, como por exemplo: ‘Eneágono’, ‘Canaã’ e ‘Dog Dilema pt.2’.”, reflete Fechine.

Logo em “Canaã”, faixa de abertura, o eu lírico reflete sobre a esperança em meio às dificuldades da vida e da realidade social, e como as amizades são capazes de tornar as encruzilhadas menos solitárias – ponderações embaladas por quatro guitarras, entre a guitarra baiana e a guitarra slide, além de outros instrumentos. “A gente faz as coisas de uma maneira muito colaborativa, aberta, abstrata e circunstancial, que faz com que nossas músicas tenham sabores, texturas e temperos que variam muito de acordo com cada composição ou cada momento. Buscamos sempre a experimentação e a descoberta de novas formas de acessar nossas próprias referências.”, completa Denovaro.

“O objetivo do disco foi progredir com a qualidade sonora das músicas, mas mantendo a identidade e principalmente tentando explorar um pouco mais a melhor versão dos Tangolo Mangos – que é a versão ao vivo da banda”

Recheado de participações, como Yves Deluc, da banda sergipana Cidade Dormitório, na faixa de título “Animais Noturnos”, o disco também se desenhou com a presença de familiares, como, por exemplo, André Becker, pai de Denovaro: “Foi a primeira experiência de Deno arranjando um sopro pro pai gravar e ficou lindão”, conta Vaqueiro.

Já em “Você Me Conhece Tão Mal”, a participação traz uma história curiosa que começou como um beat instrumental que Bruno fez em cima da harmonia de “Algoritmos (Você Me Conhece Tão Bem)”: “Gostamos do beat, mas queríamos atribuir a ele algo de canção, com cunho temático que referenciasse a sua faixa irmã da mesma forma que os acordes sampleados da batida já faziam. Chamamos Tecnoplanta (Flora Dourado) e Vênus Não é um Planeta, nossas amigas produtoras e cantoras para se jogarem na letra. Cada uma delas imergiu em algum aspecto desse contexto de caos digital algorítmico, e assim criaram melodias e escreveram as letras”, descreve.

A seleção das 13 composições se deu de maneira orgânica, sem muita pretensão, mas garantindo uma viagem no tempo desde a formação do grupo, em 2017, o que traz dinamismo, além de uma variedade de confabulações a respeito da dialética existente X inexistente. São gravações realizadas em locais e tempos diferentes: a maioria em Salvador, mas também em Lauro de Freitas e São Paulo, entre 2019 e 2023. “Todas as composições já existiam – umas mais antigas, outras mais recentes. Acho que isso deu uma mistura bacana e momentos diversos para a experiência de quem escuta o álbum na ordem. Quanto ao processo, o mais difícil mesmo é o momento de gravação e produção das músicas, e não as composições em si. Acho que sempre houve um consenso sobre essas músicas que foram entrando”, detalha Fechine.

Para a divulgação do disco, o grupo selecionou os singles “Hélio”, presente no repertório de apresentações dos Tangolo Mangos há alguns anos e um ponto alto de energia nos shows; e “Poca”, um samba rock de embalo nostálgico e dançante. “Creio que isto tenha influenciado na nossa escolha por lançá-las como singles, além do fato de serem canções que caminham por vertentes estéticas diferentes e ajudam a mostrar as abordagens sonoras que permeiam o disco”, diz Peu.

“A gente faz as coisas de uma maneira muito colaborativa, aberta, abstrata e circunstancial. Buscamos sempre a experimentação e a descoberta de novas formas de acessar nossas próprias referências”

A investigação musical e a experimentação também dialogam com o nome da obra, já que garatujas são os primeiros grafismos e expressões criativas de crianças: “Por ser uma palavra com sonoridade distinta e um significado adequado, que fazia referência a algo disforme e primordial, ao mesmo tempo dentro de uma esfera criativa. Faria sentido dar esse nome ao nosso primeiro álbum”, relata Dourado. Enquanto amadureciam musicalmente (três integrantes têm projetos paralelos), os músicos progrediam para novos afluentes, como quando subiram ao palco do Teatro Castro Alves, maior e mais importante centro artístico de Salvador, em 2022. “Foi um grande passo, porque a gente nunca tinha produzido um show em teatro, ao mesmo tempo em que a gente também tinha muita vontade, desejo de explorar as possibilidades que um teatro como a Sala do Coro do TCA proporciona. A ideia de apresentar um espetáculo de show deixou a gente muito animado, e eu acho que a gente conseguiu colocar a maioria das ideias em prática, o show ficou babado”, afirma Denovaro.

A banda agora se prepara para anunciar o show de lançamento de Gatujas em Salvador, tocando o álbum completo e recebendo convidados especiais. “Depois desse momento inaugural, temos planos de apresentações no Nordeste, Sudeste e, quem sabe, em outras localidades. As condições financeiras de realização de turnês não têm se mostrado muito sustentáveis pra gente até então, os custos envolvidos são muito altos e é difícil fechar as planilhas fora do vermelho. Zero drama, é barril mesmo, mas a gente tá na fome de conhecer novos lugares, tocar pra novas pessoas, revisitar lugares que já conhecemos, só que dessa vez com nosso novo disco. Estamos empolgados, estressados, ansiosos e com saudades dos amigos da estrada. Bem, em paralelo a isso, também estamos gravando o próximo álbum, mas esse é outro papo pro futuro dizer”, finaliza Vaqueiro.

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