10 anos de “Heaven Adores You”: uma jornada pelo legado de Elliott Smith

Nickolas Rossi, diretor do documentário, fala de sua relação com a obra do músico, relembra os desafios e objetivos do filme e reflete sobre como a voz de Elliott ainda ressoa

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Fotos: Wendy Redfern/Getty

Elliott Smith: um nome que evoca sensibilidade, talento e, para muitos, um toque de melancolia. O músico norte-americano, aclamado por sua voz singular e composições introspectivas, teve relação complexa com a imprensa durante sua curta e meteórica carreira. Essa relação e sua trágica morte ainda incompreendida formaram uma imagem precipitada sobre quem era a pessoa por trás do artista. Reportagens frequentemente focavam em aspectos sombrios da vida de Smith, como sua luta contra a depressão e o vício em drogas. A narrativa dominante o pintava como um artista atormentado, perpetuando estereótipos e ignorando a complexa realidade de sua personalidade e obra. Em entrevistas, Smith demonstrava desconforto com a forma como era retratado. Sentia que sua música era simplificada e reduzida a um mero reflexo de seus problemas pessoais.

Em 2003, a notícia da morte de Elliott Smith abalou seus fãs. Nickolas Rossi, então morando em Los Angeles, decidiu registrar o memorial improvisado que se formou no mural presente na capa do álbum Figure 8 (2000). A partir dessa experiência, a semente do documentário Heaven Adores You (2014) foi plantada. O vídeo amador de Rossi, feito com a intenção de ser uma lembrança pessoal, acabou ganhando grande atenção online. Comentários de fãs do mundo todo despertaram a curiosidade de Rossi sobre o legado do músico. Em 2008, impulsionado por podcasts e pelo crescente revival da música de Elliott Smith, Rossi decidiu levar a ideia adiante. Ele reuniu uma equipe e começou a explorar a influência duradoura de Smith na música contemporânea.

10 anos após o lançamento de Heaven Adores You, seu debut na direção, Nickolas Rossi revisita o impacto do documentário e sua própria jornada com a música de Elliott Smith. Para ele, a constante redescoberta de Elliott por novas gerações demonstra a singularidade atemporal de sua obra. Olhando para trás, Nickolas vê a importância de ter dado voz a diferentes perspectivas e reconhece que o filme não atendeu a todas as expectativas – e que algumas questões sobre a vida de Elliott Smith, como as circunstâncias de sua morte em 2003, permanecem sem resposta definitiva.

A seguir, Nickolas fala sobre como sua visão de Elliott Smith mudou ao longo do processo de fazer o documentário, sua surpresa ao encontrar um acervo rico da adolescência do artista, e como sua música ressoa 20 anos após sua morte.

 

Sei que você teve contato com a música do Elliott ainda nos anos de Heatmiser, quando morava em Portland, certo? Você se lembra ou sabe dizer qual foi o momento em que percebeu que Elliott era especial?

Hmm. Não sei se eu poderia lembrar de um momento em que pensei isso. Tipo, eu não acho que houve um primeiro momento em que eu pensei, ‘ah, ele é especial’. O que o que aconteceu foi que eu estava acostumado com o Elliott sendo parte de uma cena, sendo parte do Heatmiser, e então quando eu ouvi as coisas solo dele, fiquei realmente chocado em saber que era o mesmo cara. Não conseguia ver o Elliott do Heatmiser no Elliott solo. Então, quando ouvi as coisas solo dele, eu só pensei: “ah, o que é isso?”. Quando disseram que era o Elliott, do Heatmiser, fiquei meio impressionado.

Antes de Heaven Adores You, em 2006 você já tinha produzido um vídeo no mural da capa de Figure 8. Como foi a linha cronológica desde ali até chegar no documentário de 2014, com o crowdfunding no Kickstarter e tudo mais?

Sim. Então, quando o Elliott faleceu em 2003, eu estava morando em Los Angeles na época. E quando a notícia me pegou naquela manhã, vi que ia ter um memorial improvisado no mural do Figure 8. E eu morava a três, quatro quarteirões desse mural. Fuie levei minha câmera para documentar o que estava acontecendo; tinham muitas velas e pessoas escrevendo nas paredes… Enfim, pessoas reunidas e lembrando do Elliott. E isso foi por volta da época em que eu também estava aprendendo a editar. Peguei aquelas filmagens e coloquei uma música do Elliott e editei o vídeo, só isso. Era meio que uma lembrança só para mim. E isso foi alguns anos antes do YouTube começar. Foi tipo ‘eu tenho esse vídeo. Vou colocar esse vídeo do Elliott Smith no meu canal’. E esse vídeo recebeu muita atenção, havia bastante comentário. E o interessante foi que esses comentários não vinham apenas de Portland ou Nova York ou L.A., vinham de todo o mundo. Vinham da Austrália, da Europa, da América do Sul. Eventualmente isso despertou interesse em mim sobre qual era o legado do Elliott Smith no imaginário das pessoas.

Partindo disso, entrei em contato com algumas pessoas que estavam interessadas em seguir um projeto completo relacionado a isso. Tinha também uns podcasts rolando no final dos anos 2000, falando sobre a influência que o Elliott Smith tinha na música atual, me lembro disso. Aquilo me direcionou por onde começar também. E isso foi por volta de 2008, 2009, 2010. Nesse tempo teve um revival de bandas indie, e muitas dessas pessoas estavam mencionando o Elliott Smith como influência. E nós meio que começamos por aí. Queríamos saber qual era a influência e por que o Elliott Smith ainda estava sendo falado e ainda sendo descoberto. E isso levou a várias conversas sobre como fazer nosso filme. Foi como se as coisas simplesmente se alinhassem de uma maneira realmente ótima.

Nesse período entre a ideia e a execução, quais foram as pessoas-chave que assim como você abraçaram o projeto?

No comecinho do projeto, eu trabalhava com um diretor, produtor, roteirista muito talentoso chamado JT Gurzi — Jeremiah Gurzi. A gente morava junto em Los Angeles, trabalhando com filmes já, e ele era super parceiro. Trabalhamos nesse projeto por cerca de um ano, dois anos, talvez, só meio que juntando as coisas. Lancei uma campanha no Kickstarter e perto do final dessa campanha, recebemos um e-mail do Kevin Moyer , que estudou na mesma escola que Elliott. Basicamente, ele só perguntou como poderia ajudar. Aí a gente entrou em contato e disse que seria útil se pudéssemos começar a conversar com pessoas que conheciam o Elliott. E como o Kevin era de Portland e estava envolvido na cena musical, ele se ofereceu para nos apresentar aos amigos e colaboradores do Elliott. Ao mesmo tempo, eu trabalhava com um produtor de San Francisco chamado Mark Smolowitz, que foi indicado ao Oscar de melhor produtor e diretor. Eu filmei um documentário dele. A gente era bem próximo e ele apoiava demais o projeto. Então, entre eu e os três outros produtores a bordo, um deles em L.A., eu em Nova York, um em Portland, e outro em San Francisco, a gente se juntou com nossas melhores habilidades e colaborou para chegar à distribuição da melhor maneira possível.

“Quando morava em Portland no início dos meus 20 anos, eu tinha a sensação de ser parte de uma cena que estava crescendo. E ao fazer o filme, eu queria passar essa sensação — de ser jovem e se sentir parte de algo”

Nickolas Rossi

Entrando agora mais no documentário em si, é bem interessante o jeito como o período da infância, no Texas, é introduzida e discorrida no filme. Geralmente, pouco se sabe sobre a infância dos artistas. Como foi conhecer o pequeno Elliott Smith, e porque você acha que ele não gostava de falar sobre esse período?

Foi curioso poder mergulhar um pouco na infância do Elliott. Incrível que ele já compunha nessa época, participava de algumas bandas, tinha também algumas gravações solo. Tinha algumas músicas inéditas que estavam no arquivo com Larry Crane, que foi e provavelmente ainda é considerado o arquivista do Elliott Smith. Mas foi fascinante porque muitas dessas músicas eram pedacinhos de coisas que o Elliott traria depois, ao longo dos anos. Foi ótimo poder conhecer não apenas o Elliott Smith do Heatmiser e da carreira solo, mas voltar no tempo e tentar entender de onde ele veio. Na verdade, tudo começou a fazer sentido ao ouvir suas gravações aos 13 e 14 anos, ao ouvir as bandas que ele teve na escola, ao ver a evolução dele como compositor, como pianista, como guitarrista. Realmente evoluiu de uma maneira muito natural. E foi ótimo poder destacar um pouco disso.

E sabe, pois é, eu não sei por que ele não gostava de falar sobre esse período. Acho que todo mundo merece certa privacidade. Para muitas pessoas, a fama é algo que te deixa vulnerável e você fica exposto de maneiras com as quais não está acostumado. E acho que, como qualquer um, há certas coisas sobre sua vida que você não necessariamente precisa explicar. Enfim, sabemos onde ele cresceu, pudemos conversar com sua irmã. Foi maravilhoso poder conversar com ela sobre sua infância. Mas esse não era o ponto do filme.

Elliott Smith, Portland (Foto: Joanna Bolm)

Interessante isso, porque, como dá pra ver no documentário, há arquivos bem valiosos e expressivos sobre a vida de Elliott, mas muita coisa ali não era de conhecimento dos fãs. Vejo que as entrevistas foram o principal direcionador para a narrativa, certo? Como foi pra você enquanto cineasta, traçar o tom, o ritmo e a narrativa do filme sem ter um elemento prévio, como um documentário anterior ou coisa do tipo?

Então, a abordagem foi basicamente permitir que Elliott contasse sua própria história, junto do depoimento das pessoas que passaram por sua vida.

Sobre as referências, quando estava morando em Portland no início dos meus 20 anos, eu tinha a sensação de ser parte de uma cena que estava crescendo. E ao fazer o filme, queria passar essa sensação — de ser jovem e sentir ser parte de algo. E também coincidiu que eu morava em Portland e tinha morado em Los Angeles e estava fazendo esse filme em Nova York. E essas foram as três cidades em que a carreira do Elliott aconteceu. Então eu simplesmente senti que, como cineasta, iria abordar esse filme da minha visão, do que era fazer parte dessa cena. Até porque, a música do Elliott teve um impacto enorme em mim, então eu queria ir por aí, não dava para dissociar isso. Mas também parti do ponto de que estava fazendo um filme sobre um músico que faleceu, que não tem como entrevistá-lo. Junto disso, também estava pensando em trazer minha percepção de como os fãs o viam.

Porque depois que você faz um filme, esperançosamente, as pessoas vão assisti-lo, cinco anos depois, 10 anos depois. E estávamos querendo trazer algo que poderia ser acessível para os fãs do Elliott no futuro. Fico feliz de estar vendo isso agora. É incrível que mesmo 10 anos depois, você e muitas outras pessoas ainda estão descobrindo o filme, o Elliott, sua música, enfim.

“Quis trazer uma visão mais ampla de como era conhecer Elliott Smith – e que nem todos tiveram a mesma experiência ao conhecê-lo. Mas todos enfatizaram que ele era engraçado e sorria mais do que se pensava. Nem sempre era o cara triste e deprimido retratado pela mídia”

Sobre isso, por que você acha que o legado do Elliott se estende até hoje? O que você acha que faz gerações posteriores procurarem sua música?

Acho que isso tem muito a ver com a honestidade na música dele, com o jeito que ele se expressava. Ele escreveu músicas que são muito pessoais e vulneráveis, sabe? Ele estava realmente expondo a si mesmo em suas letras e em sua música. E eu acho que as pessoas ainda respondem a isso. As pessoas ainda respondem a essa honestidade e vulnerabilidade na música. Isso transcende gerações porque isso é algo que todos nós, como seres humanos, estamos meio que procurando na música que ouvimos. E a música do Elliott ressoa de uma maneira que a música de outros artistas talvez não ressoe.

Também acho que o Elliott tinha a habilidade de fazer músicas pop. Mas ele estava fazendo isso de uma maneira que era única para ele. E isso é identificável para muita gente. As pessoas ainda estão descobrindo o Elliott agora porque ele estava fazendo música que ainda soa atual. E ainda soa único. E ainda soa como algo que você nunca ouviu antes.

E o que mudou na forma como você o via? — antes, durante e depois do processo de fazer esse documentário.

Ainda escuto Elliott Smith e continuo encontrando elementos em sua música que me impressionam, talvez coisas que eu ainda não tenha percebido antes. Já se passaram 30 anos desde que comecei a ouvi-lo. Acredito que a constante relevância de sua música é um testemunho de sua qualidade; é incrível quanto ainda é possível descobrir novos aspectos nela. É como se você interpretasse uma letra de certa maneira em um momento de sua vida e, mais tarde, a ouvisse novamente em um contexto diferente, percebendo o quão brilhante é sua composição. Você se pega pensando como ele conseguiu isso; como ele escreveu dessa forma tão profunda sendo tão jovem? Sou um grande admirador. Minha apreciação por ele como artista só cresceu e se aprofundou ao longo do tempo. Adoro discutir a música de Elliott com pessoas que ainda não a conhecem. Gosto de ser aquele cara que introduz novos fãs à sua música. Tenho dois filhos pequenos, que ainda não conhecem sua música. E já estou ansioso para apresentá-los. Como fã, continuo fascinado por seu talento e espero que mais pessoas continuem a descobri-lo. Encontrar a música de Elliott Smith é, verdadeiramente, um presente.

Vendo o filme, tive a impressão de que XO e Figure 8 são os álbuns em que Elliott está mais confortável consigo mesmo, e isso transparece nas músicas de cada disco. Em que momento você viu que fazia sentido ir demarcando a narrativa pelos álbuns? E claro, qual o seu favorito?

É, é mais ou menos isso.

Não sei se consigo escolher um favorito. É uma tarefa difícil, não é? Para mim, acho que o álbum autointitulado (1995) é aquele ao qual eu mais me identifico em relação à minha descoberta dele como artista solo. Lembro que o Roman Candle (1994) já tinha sido lançado e, claro, tem faixas belíssimas. Mas, quando o álbum autointitulado saiu, foi nessa época que comecei a enxergar Elliott de forma diferente. Sua música se encaixou perfeitamente naquele momento da minha vida, de uma maneira que poucos álbuns realmente conseguem fazer. Acredito que muitas pessoas têm seus álbuns como seus favoritos porque os álbuns de Elliott são especialmente bons nesse aspecto — eles parecem falar diretamente com você em um momento específico de sua vida quando você mais precisa. Para mim, esse álbum é o autointitulado. Foi lançado em 1995, quando eu tinha 21 anos e morava em Portland. Toda a experiência estava conectada. No entanto, todos os álbuns são excelentes. Não dá para escolher apenas um. Há tanta profundidade em todos eles…

Mudando um pouco de assunto, mas ainda na mesma linha, em relação à trilha sonora. Como foi a experiência de trabalhar com a família do Elliott e amigos próximos para garantir que as músicas certas estivessem nos momentos certos no filme, em termos cronológicos e narrativos?

Foi ótimo trabalhar com a família e amigos próximos porque muitas das músicas do Elliott que estávamos querendo colocar no filme não tinham sido lançadas oficialmente. Então, precisávamos da permissão da família para usar essas músicas que estavam em demo ou fitas cassete caseiras. E acho que trabalhar com a família e amigos próximos nos permitiu dar um lado mais humano ao Elliott. Porque as músicas que estávamos usando eram músicas que ele fazia no porão de seus amigos ou músicas que fazia para si mesmo. Isso nos permitiu humanizar o Elliott de uma maneira que talvez as músicas que foram lançadas oficialmente não permitissem.

Claro, também usamos muitas músicas já conhecidas dele. E isso foi muito legal porque eu queria passar a sensação de que o filme estava mostrando a amplitude de sua música, mostrando músicas que as pessoas que só conheciam o Elliott Smith da rádio ou das trilhas sonoras dos filmes talvez não conhecessem. Tipo, eu queria mostrar para as pessoas que só conheciam ele por “Miss Misery (música indicada ao Oscar) que tem toda essa carreira igualmente brilhante.

(Foto: Heaven Adores You)

Agora sobre a relação dele com as cidades em que morou, fiquei com a impressão de que em Portland temos o Elliott clássico se desenvolvendo e sendo o gênio que era. Já em Nova York, o contexto é mais complicado e solitário e, por fim, em Los Angeles, foram altos e baixos. Passando por essas três cidades, como você diria que Elliott é lembrado em cada uma delas?

Não sei, talvez esse fosse um dos propósitos do filme — conversar com pessoas dessas três cidades e perguntar: “Bem, que Elliot você lembra?”. Porque o filme abrangeu quase 10 anos de sua vida, talvez até mais. Então, em Portland, as pessoas conheciam Elliott como aquele cara que estava no Heatmiser e começou a sair desse papel para descobrir sua voz solo. Conversamos com muito poucas pessoas que o conheciam em Nova York, além de Rob Sacher do Luna Club. Foi uma experiência maravilhosa conversar com alguém que apenas possuía um bar em Nova York e viu Elliott sentado lá, conhecendo-o dessa maneira. Em Los Angeles, as pessoas conheceram um Elliott diferente, e talvez tenha sido um pouco mais difícil e comovente para elas conhecê-lo naquela época, porque as coisas não estavam tão fáceis. No filme, quis trazer uma visão mais ampla de como era conhecê-lo, e que nem todos tiveram a mesma experiência ao conhecê-lo, mas todos enfatizaram que ele era engraçado e sorria mais do que se pensava. Ele era mais engraçado do que se imaginava. Nem sempre era o cara triste e deprimido retratado pela mídia. Senti que essa foi a força motriz do nosso filme: assegurar que todos saibam que existem outros aspectos além do que a mídia falava enquanto ele estava vivo.

“Trabalhar com a família e amigos próximos nos permitiu dar um lado mais humano ao Elliott. As músicas que estávamos usando eram músicas que ele fazia no porão de seus amigos ou que ele fazia para si mesmo. Isso nos permitiu humanizar o Elliott de uma maneira que talvez as músicas que foram lançadas oficialmente não permitissem”

Sobre esses momentos difíceis de sua vida, como muitos outros artistas brilhantes da sua geração, infelizmente Elliott teve uma vida conturbada em relação a uso de substâncias. Igualmente triste, foi como se deu sua morte. Imagino que ao retratar esses elementos houve uma preocupação sua e da equipe. Especificamente com as pessoas que aparecem falando sobre ele no documentário, como elas reagiam antes de ligar a câmera ao serem perguntadas sobre esses episódios?

Sim, como cineasta, parte do trabalho é estabelecer uma conexão com as pessoas com quem você está conversando e esperar que elas confiem em você com os relatos que compartilham. Nós simplesmente nos esforçamos ao máximo para garantir que houvesse uma oportunidade para que as pessoas expressassem o que desejavam sobre sua relação com Elliott. Uma vez que quase 10 anos se passaram desde sua morte quando começamos a trabalhar neste filme, pensamos que talvez fosse um momento oportuno para que as pessoas quisessem falar sobre isso. É importante dizer que houve muitas pessoas que recusaram participar do projeto e não estavam dispostas a falar. Também houve muitas outras que sequer tivemos resposta. Porém, quando se tratava de questões sensíveis, demos a todos a oportunidade de compartilhar o que desejavam. Não houve nada que evitamos discutir. Foi valioso ouvir todos os pontos de vista. Para algumas pessoas, falar sobre Elliott tantos anos depois foi um pouco catártico.

Na época do lançamento, muitas opiniões foram que o documentário expande a imagem que muitas pessoas tinham sobre Elliott, sempre atrelada a melancolia e tristeza. Junto disso, também houve observações sobre seus momentos finais, quando ele era mais solitário. Qual foi sua impressão sobre a resposta das pessoas a respeito de como você contou a história do Elliott ?

Acho que quando você faz um filme, você coloca tanto tempo e esforço nele que você meio que não sabe como ele vai ser recebido até que ele seja lançado. E lembro que estávamos em San Francisco quando lançamos o filme. Estávamos sentados no cinema, vendo com o público pela primeira vez. E foi assustador, sabe? Fiquei pensando: “será que vão gostar ou odiar?”. Lembro-me de ouvir risadas em certos momentos e soluços em outros. E é uma sensação muito intensa porque você sabe que a história que você queria contar está sendo contada da maneira que você pensou.

Espero sinceramente que as pessoas tenham apreciado o esforço que fizemos para criar um filme que celebrasse o gênio que foi Elliott Smith. Compreendo que, definitivamente, não é um filme que atenderá a todas as expectativas. Sei que algumas questões sem resposta foram apontadas pelas pessoas. Possivelmente, vão ter outros documentários, projetos cinematográficos ou até mesmo livros que possam abordar essas questões pendentes. Entendo que, uma vez que alguém se vai, muitas perguntas permanecem. Minha esperança é que tenhamos produzido um filme que sirva como uma boa introdução à vida de Elliott Smith. E se você estiver interessado em continuar explorando, sua música está aí, e você pode começar a ouvir e pesquisar tanto quanto desejar. Foi gratificante conversar com pessoas que assistiram ao filme e foram tocadas por ele. Ao mesmo tempo, também foi valioso ouvir aqueles que expressaram frustração pela falta de respostas sobre o final da vida de Elliott.

Agora para fechar — muitos fãs se perguntam sobre isso, e acho que em certo momento você também pensou isso ao fazer o filme: Se Elliott estivesse vivo, como você acha que ele seria, o que ele estaria fazendo, onde estaria morando, etc?

Elliott Smith estaria na casa dos 50 anos agora e provavelmente estaria fazendo o que quisesse. Acredito que, se ele tivesse alcançado o mesmo nível de sucesso que teve em seus 20 e poucos anos e 30 anos, provavelmente estaria desfrutando da liberdade de fazer o que desejasse e viver onde preferisse. É curioso pensar nisso. Ele já se foi há 20 anos. Na época de sua morte, eu estava no final dos meus 20 anos, e tantas coisas acontecem nesse período… É difícil imaginar o que Elliott Smith estaria fazendo agora. Talvez estivesse criando música, talvez não. Não posso afirmar com certeza. É uma questão intrigante. O que ele estaria fazendo se estivesse na casa dos 70 anos?

Quando conhecemos suas obras, compartilhamos momentos e sentimentos com artistas e sua arte, e é triste, porém reconfortante, que existam registros e documentos aos quais sempre podemos recorrer.

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ARTISTA: Elliott Smith

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