Nuven em novo instante

Mais do que “música eletrônica com elementos orgânicos”: recém-lançado EP “Hiperreal” representa uma nova página na jornada artística do produtor Gustavo Teixeira

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Fotos: Gabriel Rolim

Há instantes, escolhas e momentos que parecem definir caminhadas artísticas. Gustavo Teixeira, o Nuven, parece viver essa etapa com o EP Hiperreal, recém-lançado nas plataformas de streaming (pela Balaclava Records) e encarado como uma “página nova”. Após, desde 2015, colocar alguns EPs e um disco na praça, o produtor se tornou dono de um estilo musical bastante característico e original.

De difícil conceituação para além de “música eletrônica com elementos orgânicos” –como o próprio Gustavo define –, o fluido som do Nuven parece se encaixar ao título escolhido para o novo EP, uma vez que elementos “reais” também têm sua dose de protagonismo na construção de ambiências e texturas. A voz de Ale Sater (Terno Rei), que já havia colaborado em “Circulares” e “Entre Águas”, aparece em “Par de Ondas”, gravada uma semana antes do início da quarentena – e “sem tempo para ser refeita”. A faixa ganhou clipe dirigido por Nicolas Camargo.

Ainda que o reencontro ganhe os tons esperados na ótima faixa, a parceria com Apeles surpreende pela hibridez de linguagens. “Eu já tinha feito um arranjo para uma faixa do primeiro álbum dele e ao mesmo tempo sempre falávamos que queríamos fazer uma música juntos”, conta Gustavo. Além da produção dialogar com ambos os trabalhos autorais, ela mostra a habilidade de Gustavo como produtor. É fácil enxergá-lo fazendo esse tipo de “serviço” para outros artistas e universos sonoros. Inclusive, atualmente ele busca parcerias entre cantoras e rappers, a fim de ampliar seu leque de produção.

Ex-guitarrista da banda Rancore, Gustavo tem um passado de shows e palcos, e Hiperreal chega em um momento em que Nuven se revela mais confiante e prendado em seu trabalho como produtor. Se seu set em 2015 era uma combinação entre controladoras, computador e alguns poucos synths analógicos, agora as possibilidades aumentam e se transformam. A vontade é conseguir tocar, experimentar e fugir um pouco da reprodução de suas faixas, tornando-as mais flexíveis a pista de dança e  outros ambientes.

Justamente por não se adequar a gêneros como House ou Techno, seu som acaba flertando mais com o Indie. Ou com rótulos como o chamado por aí de IDM  (Intelligent Dance Music), alcunha com certa dose de soberba que integra músicos como Floating Points, Caribou, Four Tet, entre outros. Longe de achar seu som “inteligente” ou algo do tipo – apenas seu – Gustavo já constrói seu som ao vivo de outra maneira e em breve deve promover uma live aberta ao público.

A confiança no processo e o acúmulo de ideias tornaram o período, durante a pandemia, prolífico. “Eu me sentia um pouco inseguro em relação a minha mix, algo que consegui desenvolver muito durante a pandemia, me aprofundei no aprendizado e Hiperreal é um reflexo disso”. Sem a correria para um lançamento em maio, a quarentena também o fez desacelerar e passar por cada etapa de maneira mais minuciosa. Mesmo assim, o lançamento de um trabalho ganha contornos atípicos, diante da grande incerteza sobre as voltas dos shows e de festas online que funcionam, de uma só vez, como respiro e aumento da saudade.

O que resta é seguir produzindo em casa. Gustavo mostrou alguns discos que fizeram parte de seu processo de composições/acúmulo de referências e ideias para o novo EP. Trabalhos de Sun Ra, Rival Consoles, Devonwho, Dauwd, Youandewan e DJrum revelam a complexa aglutinação de sons e texturas das composições do Nuven. No vídeo abaixo, temos uma pequena amostra de um improviso que deve integrar as próximas apresentações. Por enquanto, online.


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ARTISTA: Nuven

Autor:

Economista musical, viciado em games, filmes, astrofísica e arte em geral.