As novas mitologias de YOÙN

Em “Unicórnio”, a dupla carioca injeta elementos diversos em sua atmosfera jazz e se abre para uma série de parcerias – incluindo a produção afiada de Carlos do Complexo

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Fotos: Entusiasmo Visual

Para Shuna e GP, músicos que formam o duo YOÙN, a figura mitológica do unicórnio tem um simbolismo claro de unicidade: é aquele ser que é único e que trilha caminhos inesperados. Para exemplificar de forma palpável essa referência, Shuna apela para o basquete e a NBA, citando a figura de Victor Wembanyama, jovem prodígio de 2,24m que realiza movimentos e jogadas inesperadas para seu porte físico e que é considerado um unicórnio no mundo do basquete.

Entendendo a dificuldade desse repórter para as metáforas esportivas, Shuna vira o jogo e pergunta:

– Na sua família tem algum outro jornalista? Sua mãe ou seu pai eram da comunicação?

E não, meu pai era marceneiro e minha mãe, professora de escola pública – não estava nos planos um filho jornalista musical. É essa curva inesperada que marca as figuras unicórnios segundo a perspectiva da dupla. Podemos ser os “unicórnios” de nossa comunidade, de nossa família, de nosso grupo de amigos. Shuna e GP são os unicórnios de sua comunidade: dois artistas negros jovens que conseguiram viver de musica e que transformaram seu projeto YOÙN em um sucesso.

Desde o lançamento de BXD in JAZZ, em 2021, a dupla conquistou um grande número de ouvintes – inclusive alguns bem famosos – e se transformaram em sinônimo de refinamento e criatividade na atual música brasileira. Unicórnio, seu novo disco, é uma expansão dessa pesquisa ampla da dupla, que dialoga com diferentes gêneros de forma bastante pessoal.

“Nesse segundo trabalho, a gente queria dar uma experimentada no nosso som, em outros flows e encaixar coisas que já pertencem a gente – como o house, o pagodão, essa onda das músicas originárias de periferia”

“Um primeiro trampo é muito difícil de mostrar todas as faces de um artista, de mostrar todas as possibilidades sonoras que ele tem”, explica Shuna. “A gente queria, nesse segundo trabalho, dar uma experimentada no nosso som, em outros flows e encaixando em coisas que já pertencem a gente – como o house, o pagodão, essa onda das músicas originárias de periferia”.

Para GP, o YOÙN não consegue ser enquadrado em determinados gêneros carregar uma fluidez ao transitar por diferentes sonoridades. “A ideia desse álbum é mostrar um pouco mais de tudo isso, mostrar que a gente pode fazer um trap, um pagodão baiano, um neo-soul, podemos fazer jazz. O YOÙN não tem muito limite para fazer música, nosso rolê é o sentimento que cada música pode trazer”, finaliza GP.

Para esse novo trabalho, eles firmaram uma parceria importante com o produtor Carlos do Complexo – dono de um dos grandes discos de 2023, o NTGM. “Carlos do Complexo é como se fosse um terceiro elemento que somou em todo o disco, ele produz todas as faixas, é uma peça essencial”, explica Shuna. E foi na casa de Carlos que Unicórnio começou a ser construído. Os três artistas se uniram para compor algumas coisas, experimentar beats e assim surgiram as primeiras composições, sendo o marco zero desse novo projeto a canção “Coisas Simples”.

“O YOÙN não tem muito limite para fazer música, nosso rolê é o sentimento que cada música pode trazer”

Além de Carlos do Complexo, uma série de nomes aparece durante o disco: Rashid, Tuyo, KING Saints, Sango, Wax Roof, Duquesa, Zamba, Pivet Panda, Ajuliacosta, Luccas Carlos e Zudizilla. É uma lista grande para quem vinha de um disco inteiramente autoral e sem participações, mas para o YOÙN há uma troca importante nas parcerias e nos encontros com esses artistas – em sua maioria, nomes jovens e da mesma geração que GP e Shuna.

“O lance da colaboração sempre vai trazer uma surpresa, porque você não é a outra pessoa, ela fará coisas que você não faria, por isso a gente queria trazer essa experiência pra banda, por nunca termos trabalhado com outras pessoas e, como consequência, para o público também”, explica Shuna. “Não é fácil somar, cada pessoa vai cantar numa região, cada beat entra de um jeito pra cada voz, então esse sistema de abrir mão pelo bem maior da música foi interessante, essas trocas são muito ricas.”

“Carlos do Complexo é como se fosse um terceiro elemento que somou em todo o disco, ele produz todas as faixas, é uma peça essencial”

Com Unicórnio nas ruas, os planos do YOÙN se colocam em dois caminhos: um é tocar cada vez mais e circular pelo Brasil, pois eles entendem que foi a experiência do palco que fez a diferença para a construção do novo disco. A troca com o público nos shows fez a banda investir em mais canções que tivessem uma força para serem cantadas em coro e que trouxessem essa energia única do ao vivo, que é muito diferente do estúdio. Mas mais que isso, a ideia é que o álbum se expanda e que esse disco seja apenas um lado A de um projeto ainda maior que está em gestação. De todo modo, eles fazem mistério sobre os próximos passos e não revelam totalmente o que virá nesse próximo capítulo.

Enquanto GP e Shuna trabalham em seus próximos “unicórnios”, o que já temos em mãos é um repertório rico de uma dupla de artistas que não liga para rótulos e que busca cada vez mais entender a complexidade e amplitude da música negra periférica em suas diferentes vertentes.

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ARTISTA: YOÙN

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