Decifrando Lorac Issum

Projeto de B2B feito pelas DJs Cashu e Amanda Mussi é atração da noite Eletrônica promovida por Monkeybuzz e Orfeu

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Fotos: Red Bull Content Pool

Este ano não chegou ao fim, mas já rola uma certeza: as minas DJs causaram muito. Sem dúvida, 2018 foi o ano das brasileiras roubarem a cena dos caras na pista dos clubes internacionais mais respeitados do circuito Eletrônico. Duvida? Dá uma olhada na lista de gigs que a DJ Cashu (Mamba Negra) bateu neste ano: Panorama Bar, Dekmantel e De School em Amsterdam e Rex Club na França.

Mais uma prova desta teoria é a agenda de Amanda Mussi (Düsk). Numa turnê pelos EUA, ela tocou na The Lot Radio, Lights Down Low, Noctuary, Sublimate, Bossa Nova Civic Club, além de ter tocado na pista principal do Berghain, STR8 e outros rolês importantes na Europa.

Se o panorama feminino está positivo, acredite, ainda dá para melhorar. Em comum, as duas DJs são amigas, vizinhas e se apresentam juntas no projeto LORAC ISSUM, uma das atrações que mais chamou a atenção na última edição do Red Bull Music Festival SP. Quem dançou na pista delas pode repetir a brisa hoje (7/12) na noite do Monkeybuzz na SIM São Paulo, que rola a partir da meia noite no Orfeu. Hoje, também rola uma edição da Düsk, after perfeito para quem está a fim de esticar o rolê, pois será dado desconto aos que tiverem a pulseira da noite do Monkeybuzz.

Em entrevista feita com as duas artistas oriundas do underground paulistano, que estão ganhando cada dia maior atenção internacional, elas contaram mais sobre o trabalho com LORAC ISSUM.

MONKEYBUZZ

Quando vocês se conheceram?

LORAC ISSUM

Nos conhecemos em meados de 2014, na época frequentamos as mesmas festas, como Vampire Haus e Dsviante. Tínhamos várias amigas em comun. Chamei a Amanda para uma Rádio Vírusss e com o tempo ficamos mais próximas.

MB

Quais fatores musicais foram relevantes para vocês se conectarem?

LI

Quando começamos a tocar juntas em casa, percebemos que a nossa pesquisa sonora de Techno Industrial, Lo Fi, Acid se somavam bastante, sempre criando uma atmosfera mais suja, com bastante texturas e percussão.

MB

Cashu, quais são as características da performance como DJ da Mussi que você mais curte e admira?

LI

Ela não deixa cair a energia da pista e tem técnicas de mixagens rápidas muito boas, minhas mixagens sempre foram mais longas a um ano tocando com ela consegui pegar as manhas de mixar rápido quando necessário. Além disso, a pesquisa dela é maravilhosa e muito grande, eu pessoalmente adoro como ela sempre tem um techno gay na manga para não deixar ninguém parado.

MB

Amanda, quais são as características da performance como DJ da Cashu que você mais curte e admira?

LI

Eu adoro a sensibilidade que a Cashu tem na hora de sobrepor as tracks, ela é bem calma e deixa as músicas se mesclarem de uma forma envolvente. Também curto muito a seleção musical dela, cada vez que a vejo tocar eu gosto mais, sou suspeita para falar! A densidade dos sets dela é super marcante.

MB

Elementos de Electro, Acid, Techno e Breakbeats estão no set de vocês que é altamente dançante e de beats rápidos. Vocês pensam em gêneros musicais quando tocam juntas? Como é o processo de criação em parceria na hora de fazer um set em B2B? Existe algo pensado antes ou rola no improviso total/sintonia com a pista?

LI

Geralmente na semana de uma gig juntas nós combinamos um primeiro treino em casa, na medida que vamos tocando, vamos ouvindo as novas tracks de cada uma e sentindo para que caminho está indo o set. Desta forma, definimos as sonoridades que vamos querer explorar em cada set e marcamos mais um treino próximo à gig para aquecer.

MB

Qual é a linha de pesquisa de vocês juntas que é diferente do que rola por cada uma em versão solo? No que a Cashu e a Mussi apostam quando são LORAC ISSUM?

LI

Como as nossas pesquisas juntas se ampliam, conseguimos explorar mais uma sonoridade específica. Por exemplo, como no RBMF na semana passada, onde focamos bastante no Breakbeat e Electro, com alguns technos percussivos no meio.

MB

Quais selos andam fazendo a cabeça de vocês?

CASHU

Eu tenho amado tocar tracks do selo Insurgentes da Colômbia, descobri quando fui para lá esse ano e ganhei um vinil super foda. Estou viciada em um selo que chama LINDA Records, é bem pequeno mas tem uns releases super fodas com vocais inclusive. E o Machine Jazz selo da Ananam é incrível, também é novo e tem poucos releases até agora.

AMANDA

Tenho ouvido bastante os selos de pessoas que fiquei amiga ao longo das turnês como Jack Dept da Volvox, Monday Off da Mary Yuzovskaya, Gradient da Jamaika Suk, Jujuka da Julia Govor, BBBBBB do Bjarki, e tem um selo que faz minha cabeça desde sempre, o LPZ Records do Paraguai, e eu tenho curtido muito também descobrir selos independentes latino americanos como Cazeria/Cazador do Chile, Danza Negra e Broken Mind Recordings da Ana Gartner da Colômbia. Em Nova York, tive a oportunidade de visitar o escritório do selo Bank Records, que é da mesma galera do LIES, eles me deram vários discos legais.

MB

Cashu e Amanda, neste ano, vocês tocaram em vários lugares importantes da cena internacional. Como vocês avaliam a abertura para Djs do Brasil na Europa e nos EUA? De que forma essas incursões internacionais mudam a perspectiva de vocês em relação a nossa cena local?

LI

Acho que para os latino americanos sempre foi mais difícil ter visibilidade no hemisfério norte em qualquer área da vida, e com certeza isso é sequela de colonização e falta de privilégios. Porém, estamos num ótimo momento em nossa cena e isso está fazendo com que nos vejam mais. Todavia, somos 1% que tem esse reconhecimento, essa abertura foi bem tardia na nossa opinião e essa troca tem muito que amadurecer ainda, pois levamos anos trazendo muito mais artistas internacionais em comparação com artistas daqui que são levados para fora. Acreditamos que está mudando a forma como as demais cenas e países nos enxergam. A cada viagem que fazemos, mais valorizamos o que estamos fazendo aqui, assim como o que tem sido produzido é único e muito especial e é feito de um jeito só nosso. A liberdade que temos aqui, mesmo com todos os obstáculos do nosso sistema, é algo que você não vê em qualquer lugar.

Red Bull Content Pool

MB

Uma onda conservadora assola as estruturas do país, com perseguição a homossexuais, trans e mulheres por apoiadores do presidente eleito Jair Bolsonaro. Neste panorama de intolerância e violência, quais elementos transformam as festas eletrônicas em um espaço maior de resistência? Em tal contexto, a música eletrônica, com todo seu universo artístico, comportamental e fashion, pode ser instrumento de mudança e questionamento?

LI

Este momento que estamos vivendo no país é muito crítico e coloca as mulheres LGBTQI+ em situação de risco, as festas como ambiente onde esses grupos circulam e se sentem acolhidos tornam-se então espaços de maior resistência só por existirem. No aspecto comportamental, muitas artistas da cena e o público exploram seu corpo e a liberdade corporal. Isso é extremamente importante para o empoderamento feminino e transsexual, impulsionando pessoas do público a deixarem tabus de lado, se aceitarem e a conhecerem o seu corpo. Além de levantarem questões importantes, as festas também atuam como uma micropolítica, criando o ambiente que acreditam ser o mais justo para a sociedade. Como as medidas de listas Trans Free, o apoio contra os abusos e as preocupações com água de graça que todas as festas deveriam adotar. Fizemos na Mamba Negra e isso reduziu 80% das ocorrências na ambulância, e reduz muito pouco o lucro de bar porque muitas pessoas continuam querendo comprar a sua garrafa.

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