Hermanas no topo

DGTL ganha pontos ao escalar DJs latino-americanas no line-up

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Fotos: Ótimo Karater

“O que vocês realmente vieram fazer aqui na América Latina? Vocês não gostam de nós, da nossa música? Existia uma intenção genuína de verdadeiro intercâmbio cultural? Estou farta desse jogo em que o que vocês etiquetam em nossas cabeças não significa nada além de uma validação no mercado. Estou cansada da sua presença arrogante por aqui e realmente não quero mais fazer parte de algo no qual eu não acredito. Nossa amizade falsa acabou — cansei de vocês, Dekmantel”.

Foi através deste recado sem a menor cerimônia que a produtora chilena Valesuchi inflamou a comunidade musical pelo mundo. Ao questionar a falta de artistas sul-americanos na versão europeia do festival Dekmantel, ela levantou um importante debate sobre o autêntico  intercâmbio cultural entre eventos europeus. Afinal, fazem edições por aqui, mas não levam artistas locais para tocar no palco deles. Exploração? Perpetuação da síndrome de colonizadores?

Na opinião da DJ Amanda Mussi, atração do festival DGTL , que rolou no final de semana, e uma das grandes mentes por trás da agência AltBookings, a resposta oficial do Dekmantel não se refletiu em atitudes concretas.  Na entrevista ao Monkeybuzz, pedimos a avaliação dela a respeito da repercussão da atitude de Valesuchi. “Acredito que foi extremamente importante o que a Vale fez, e mudou bastante coisa desde então. Eu vi uma onda de eventos levantando essa questão, incluindo mais latinos em seus line-ups, e apoiando a causa. Por outro lado, sinto que a resposta dada pelo festival foi apenas para cumprir protocolo. Ainda é muito recente para afirmar qualquer coisa, mas agora cabe a todos refletir se essa consciência realmente foi absorvida e daqui por diante passaremos a ter essa preocupação mesmo. Também não podemos esquecer de exigir nosso espaço por direito.

“Eu como sou metade paraguaia e trabalho com a cena de lá, bato nessa tecla há muitos anos.  O tanto de xenofobia que já vi por parte de contratantes quando eu comentava que os artistas eram paraguaios, você nem imagina… Da mesma forma como a Vale se posicionou na declaração,  temos que continuar lutando pelo nosso espaço para que sejamos reconhecidos entre nós mesmos da América Latina ao invés de ficar só investindo em atrações europeias e americana.”

Para benefício do público, a edição do festival holandês DGTL em São Paulo ganhou pontos ao escalar Valesuchi, Amanda Mussi, Andrea Paz , a chilena Julianna e as brasileiras Ju Frontinn e Eli Iwasa.

“A globalização desempenhou um grande papel na indústria da música. Finalmente, podemos pensar como uma grande comunidade. Foi tão difícil entender esse aspecto de estar isolada apenas pela minha localização geográfica. E também podemos constatar que muitas pessoas da Europa não sabiam, por exemplo,  que na Colômbia nós criamos uma grande cena Techno. O tempo, a internet e o nosso talento natural nos deram a chance de criar conexões de empatia com diferentes rolês e pessoas de todo o mundo que têm os mesmos ideais e objetivos,  que devem ser orgânicos para criar uma grande comunidade global para ter a presença de artistas latino-americanos em festivais. A Argentina, por exemplo, estava ausente para os maiores festivais que não estão interessados ​​em trabalhar com os artistas locais, [que pensam o seguinte] Você pode se relacionar que estava acontecendo lá, mas nós não queremos isso para o nosso continente”, afirma a colombiana Julianna a respeito da presença de artistas sul americanos nos line-ups internacionais.

Do mesmo jeito que no Brasil proliferam festas independentes capitaneadas por mulheres, como já destacou Eli Iwasa em entrevista ao Monkeybuzz, o movimento está alastrado pela América do Sul. “Existem várias, as que já fui são: no Chile, com o festival Recreo da Andrea Paz, na Argentina, a New Trash da Zomvic” conta Amanda Mussi.

Em passagem pelo Brasil, que veio anteriormente para tocar numa Gop Tun, a DJ Julianna ainda é um nome forte da cena feminina na Colômbia, fortalecida pelo coletivo de minas NÓTT. “Nós estamos mais ativas do que nunca! Estamos nos corres há três  anos, de forma muito lenta. Festas, workshops e trabalho com nossas unhas para tentar construir algo em torno de artistas femininas latino-americanas. Em maio, faremos uma curadoria no Baum Festival. Lançaremos em junho a primeira coletânea com músicas de diferentes artistas latino-americanos. Essas  iniciativas nos animam muito, então, espero que possamos continuar trabalhando isso por um longo tempo”, revela a DJ, uma das integrantes do projeto que busca fortalecer o protagonismo da mulher na cena eletrônica.

Recentemente, Julianna ganhou destaque em uma reportagem especial do site Resident Advisor, no qual mostrou a relevância da cena eletrônica local . “É ato de resistência em muitos níveis. A questão é que a cena daqui não é muito consciente sobre o quão relevante é lançar uma festa em um ambiente tão hostil. Eu nasci nos anos 80, era uma época em que o Narcotráfico estava apenas começando. Nossa sociedade era completamente intolerante durante este tempo (ainda na verdade, em nível menor). Mas, agora, por exemplo, nós temos a sorte de ter milhares de pessoas dançando e se tolerando em um mesmo lugar, o que para mim é um grande ato de resistência.  

No papel de testemunha do crescimento de clubes e festas locais, ela ainda falou sobre a relevância do Mansion Club, que foi desativado, mas teve grande importância ao fomentar artistas. “Mansión club foi o local onde eu costumava ser residente, fecharam suas portas há dois anos. Eles eram mais focados em Techno, mas os últimos anos desempenharam um papel importante como curador de diferentes gêneros musicais, trazendo artistas para a nossa cidade que em algum momento nós imaginávamos ver tocar aqui. Infelizmente, foi tão difícil continuar com as mesmas ideias e objetivos que eles decidiram fechar”.

Quer saber mais? Confira a seleção de DJs e produtoras latino-americanas feita pela Amanda Mussi.

Colômbia

Magdalena a.k.a. Ana Gartner

Andrea Arias

Julianna

Chile Andrea Paz

Katalina Schwarz

Pia Sotomayor

Argentina

Amin Diamin

Zomvic

She Teiks

Cadena Nacional

Violett

Ana Helder

Paraguay

Victoria Mussi

Kokó

Natalia Doljak

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MARCADORES: DGTL, Techno

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