SINAPSE: farol na neblina

Tim Hecker, Colin Stetson e a experiência expandida da música instrumental

Loading

Fotos: Mariana Poppovic

Um músico e suas livres associações nas zonas de contato da arte (às quintas-feiras).

 

MAR REVOLTO

Tim Hecker, Colin Stetson e a neblina

 

O compositor canadense Tim Hecker lançou há pouco tempo um álbum intitulado No Highs, o 13º em sua longa trajetória como músico experimental. Seguindo a linha de pensamento de seus antecessores, o disco avança em grandes ondas sonoras, entrecortadas por ruídos metálicos. A sinopse do álbum, ao descrevê-lo, sugere metáforas náuticas, falando de ritmos pulsantes que soam como alertas, um código morse diante de uma tempestade que se aproxima.

No Highs parece ter nascido a partir de uma insatisfação do músico com o estado atual da Ambient, que, num mundo pós-pandemia, foi consumida por uma mentalidade corporativista e pasteurizada para um público mais alargado como uma espécie de ansiolítico.

Tim Hecker declarou:Qual a função da música? Servir de pano de fundo para o WeWork, para o mundo da produtividade, para alguém que quer programar? Ou é para alguém que dirige numa estrada enevoada, em busca de uma experiência expandida?” Nesse sentido, Hecker ironiza a placidez e a produtividade aesthetic desse cenário. Os títulos das faixas, como “Monotony” e “Living Spa Water”, propõe um cenário enevoado contra as ideias concisas do algoritmo.

Um dos convidados de Tim Hecker para esse álbum é Colin Stetson, saxofonista que preenche as atmosferas de Hecker com um enxame de notas musicais que nunca cessa. Stetson, quando toca, usa uma técnica chamada respiração infinita, inspirando pelo nariz ao mesmo tempo em que consegue assoprar no instrumento. Conforme toca esse drone, ele canta e percute no sax e, com o uso de microfones adicionais no seu corpo, consegue emitir uma sonoridade única.

Stetson também lançou um álbum solo recentemente, intitulado When we were that What Wept For the Sea. O curioso é que ele também usa o imaginário do mar para descrever seu trabalho instrumental, evocando a imagem de um farol em meio à neblina, sirenes que anunciam um perigo iminente antes do céu abrir e as águas acalmarem. É uma espécie de manifesto acidental da música instrumental contra o lugar utilitário, de calma e tranquilidade, que lhe foi concedido nos últimos anos.

Loading

Autor:

é músico e escreve sobre arte