Marina Sena em nova paisagem

No recém-lançado disco “Vício Inerente”, a cantora mineira renova seu leque de influências, trazendo o drill, o trip hop e o funk para a dança, em uma ambientação que mistura atmosfera futurista e toques retrô; “Não queria a presença do violão. Eu queria perder essa característica crua, muito orgânica”

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Fotos: Fernando Tomaz

Antes da chegada do De Primeira ao mundo, Marina Sena confessou ter medo. “Eu não acreditava que ia dar conta de bancar sozinha”, revelou em entrevista ao Monkeybuzz, em 2021. Esse sentimento, contudo, se esvaiu rapidamente durante a produção do primeiro disco solo, que lhe deu confiança e autoestima suficiente para entender o próprio lugar na música brasileira: o de uma pop star.

Pela rápida projeção nacional que o registro tomou, percebemos que, de fato, era A Vez de Marina Sena. Em poucos meses, De Primeira arrebatou três prêmios do Prêmio Multishow, nas categorias Experimente, Revelação do Ano, Capa do Ano, além de conquistar duas indicações honrosas no Grammy Latino nas categorias de Melhor Álbum Pop Contemporâneo Brasileiro e de Melhor Canção Brasileira pela faixa “Por Supuesto” — hit que caiu na graça do algoritmo do TikTok.

Em dois anos, a cantora viu os fãs digitais serem convertidos em uma massa populosa e voraz, presente em todos os seus shows. Agora, são mais de 2 milhões e 700 mil ouvintes mensais só no Spotify, e é para essa plateia que Sena apresenta a sua nova versão, ainda mais confiante e sedutora, em Vício Inerente, lançamento que chega nesta quinta (27) em todas as plataformas digitais, pela Sony Music Brasil. A cantora divulgou o contrato firmado com a gravadora em fevereiro.

“É igual De Primeira! Falei que ia bombar de primeira. Então, óbvio que as pessoas vão viciar, é inerente a você”, antecipa a artista, em entrevista ao Monkeybuzz, na sede da gravadora.

No seu mais recente repertório de 12 faixas autorais, Sena abraça uma estética não orgânica e, com o mel pop característico, se aventura por uma mistura de contrastes e ritmos que ainda não havia explorado em sua trajetória, como drill, trip hop e trap. Flertes com pagotrap, funk, reggaeton, além da já conhecida influência da MPB, também entram no caldo – combinados ao uso do autotune. “Eu não queria a presença do violão [no novo disco]. Eu queria perder essa característica crua, sabe? Muito orgânica”, explica.

Para isso, até o processo de composição foi diferente do De Primeira. Em Vício Inerente, Sena optou por rimar em cima dos beats e buscou por canções mais energéticas, todas produzidas por seu companheiro musical, Iuri Rio Branco. Essa mudança no formato, inclusive, coincidiu com a chegada da artista à cidade de São Paulo.

“A menina mudou pra cidade grande, tá morando em São Paulo, ganhou dinheiro e tá andando de carrão”

A correria e o concreto ressoam nesse novo momento que brinca com o urbano, misturando uma atmosfera futurista a lampejos retrô, com luzes azuis brilhantes e provocantes. Essa nova ambientação sci-fi é a perfeita contraposição ao cenário arborizado em que Marina Sena costumava protagonizar enquanto estava em suas duas bandas anteriores e desenvolvia suas emoções criativas. “Eu mudei quando era A Outra Banda da Lua, mudei quando era no Rosa Neon, mudei pro De Primeira […]. Mudei porque não tem como, tipo, é outra coisa. É outra personalidade, é outra personagem, é outra persona. Quando você muda, precisa ser fiel ao que você tá defendendo. E eu costumo ser fiel ao meu personagem”.

Apesar do receio de que a mudança de ambiente pudesse afetar sua inspiração criativa, a aproximação com a cena independente de São Paulo, especialmente com o Brime, formado por Febem, Cesrv e Fleezus, renovou o desejo da artista de explorar novas texturas e se permitir apresentar um trabalho diferente daquele que a levou a assinar com a maior gravadora do Brasil. “Eu componho no que estiver favorável. No momento, rimar no beat está bem favorável [risos]”.

A união nos leva ao único feat do disco, em “Que Tal”, parceria com Fleezus, de produção azeitada em uma mescla de elementos pop e singelas batidas de funk – e criada em um momento de pura descontração entre os artistas. Ao falar sobre a participação, Sena elogia o parceiro de faixa:

“Acho ele um dos maiores artistas do Brasil. Independente de número, ou o que for, para mim, a arte dele é a linguagem de São Paulo. Acho que o som dos meninos representa muito essa juventude que está correndo atrás dos sonhos, sabe? Que está ralando, acordando cedo, pegando o metrô para melhorar de vida. E eles são essas pessoas. É muito lindo ver como eles representam uma galera. Eu acho isso muito moderno, muito chique. Sou fã mesmo!”.

A atmosfera-de-cidade-grande, porém, não é a única que se destaca na nova produção. Existe tração, mas há muito swing, com notável influência de ritmos latinos, como é o caso da música “Tudo Seu”, que chega a remeter a clássicos de Santana. Em “Mais de Mil”, a artista homenageia a cadência do funk característico de Belo Horizonte, mas com a sua própria roupagem; enquanto em “Mande um Sinal”, o ar se derrete junto à voz de Sena, que canta inspirada em Cassiano e na sua diva suprema, Gal Costa.

A mesma que também guiará os próximos passos da artista escalada para o The Town, festival estreante em São Paulo. Nele, promete um show inédito para homenageá-la. “Acho que em algum momento eu achei que teria que fazer um show cantando Gal Costa, porque eu me preparei a vida inteira pra isso. Já tinha um repertório pronto antes de pensar no show. […] Vamos fazer um tributo a Gal Costa, para honrar essa voz que me atravessou e me atravessa, mais do que qualquer artista, mais do que a mim mesma. Ela é realmente a maior referência da minha vida”.

“Eu mudei quando era A Outra Banda da Lua, mudei quando era no Rosa Neon, mudei pro ‘De Primeira’. Mudei porque não tem como, é outra coisa. É outra persona. Quando você muda, precisa ser fiel ao que você tá defendendo. E eu costumo ser fiel ao meu personagem”

Ser pop star é bom, mas cansa…

Embora a rotina agitada seja combustível para as canções da artista — ela revela que boa parte das canções são escritas no ‘me dá mais 5 minutinhos, tô terminando uma música aqui’ —, o cansaço da agenda também bate. “Tem hora que eu falo assim: ‘Oh, meu Deus. Que que eu fui inventar, sabe? Tava de boa lá em Montes Claros, o dia inteiro vagabundando. Era tão bom [risos]”.

Com seus recentes compromissos, Sena revela que tem aberto mão de certos aspectos de sua vida pessoal para conseguir lidar com tudo, algo que é esperado durante esse processo de ascensão. Contudo, as recompensas vêm em forma de carinho do público e a grandiosidade dos palcos. Além do festival The Town, a cantora está começando a agenda de shows da sua nova turnê e se preparando para uma viagem à Europa.

Ao analisar o sucesso da própria trajetória, Sena recorda sua evolução como uma artista de destaque. “É uma sensação agradável porque você se apropria. Eu percebi que tinha talento para isso, sabe? Talentos para ser líder e é muito legal ser líder”. A artista também relembra seu primeiro grande show no Lollapalooza 2022: “Foi muito empoderador. Porque eu nunca tinha feito shows tão grandes antes, né? E então descobri que eu era capaz de fazer um grande show. Foi uma espécie de pesquisa. Eu pensei: ‘Para aguentar esse palco, vou precisar ter muito mais disposição, preparo físico e vocal'”.

Segundo ela, a experiência foi crucial para que ela entendesse como sua arte preencheria o espaço do palco. “É preciso ocupar todo o espaço. Você tem que encontrar uma maneira de deixar sua alma e espírito maiores. Sinto que minha performance cresceu e meu palco também ficou mais bonito. Acho que fizemos vídeos mais bonitos. Coloquei o balé no palco que dá outra vibe, outro negócio. Mas é do meu jeito também”.

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ARTISTA: Marina Sena