Resenhas

Bru._.Jo – Bru._.Jo

Entre ambient, experimentalismo e música clássica, duo coloca sopros e sintetizadores em interação improvisada com a natureza

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Ano: 2023
Selo: YB
# Faixas: 9
Estilos: mbient Music, Minimal, Downtempo
Duração: 43'
Produção: Bru._.Jo

A música está vinculada massivamente à técnica. O trabalho mental que se coloca no processo artístico faz dela um campo de criativas possibilidades dentro das habilidades musicais. No entanto, a música também tem a ver com aquilo que não se controla. Aquilo que, por mais que estudemos a fundo, conserva certo mistério oculto. É possível encontrar resquícios deste mistério por meio das formas de música menos controláveis – a improvisação, por exemplo. Ao invés de ser um processo racional e lógico, a música improvisada se coloca como um jogo de reações. Os músicos a todo instante estão respondendo a sons colocados na roda – seja em um improviso de jazz, samba, música eletrônica ou, como no caso dos irmãos Joana Queiroz e Bruno Qual, em um diálogo com a natureza.

Reunidos sob o nome Bru._.Jo, os irmãos multi-instrumentistas trazem essa noção do improviso ao campo do que é incontrolável – a natureza. Durante uma imersão de uma semana foram gravadas sessões de improviso de instrumentos de sopros e sintetizadores, mas que também interagem com os sons do ambiente. Assim, o que poderia ter sido reduzido facilmente a um cenário da gravação, torna-se também agente principal da construção estética. É deste híbrido entre natureza incontrolável e tecnologia controlável que se forma o primeiro e autointitulado disco do duo. Uma mescla que cria um espaço no qual emergem diferentes intersecções de gêneros musicais – do ambient ao experimental –, mas que, sobretudo, desafia a previsibilidade sonora a partir do contato com a natureza.

O universo aqui é rico nas sutilezas com as quais os elementos acústicos e eletrônicos são misturados. Ainda é possível perceber individualmente as particularidades do sopro ou as texturas eletrônicas, mas prevalece a ideia de que a soma das partes é diferente do total. Assim, verdadeiros complexos de sonoridades vivas são desenvolvidos – nas texturas sutis e melancólicas da faixa de abertura “Granulares Matinais”, passando pelo improviso tenso e manso de “Floresta (Debaixo da Terra), ou ainda na orgânica “Líquens e Fungos”. É um trabalho que parece pensar seus elementos menos como regras e mais como exercícios criativos que não podem ser plenamente domesticados. Talvez por isso o disco seja tão difícil de categorizar em gêneros – é uma obra que se pauta muito mais no aspecto simbólico e abstrato. Ainda assim, os sons convidam os ouvintes a criarem, nesta floresta de sons, experiências identificáveis.

Bru._.Jo, por meio de uma premissa de improvisação simples, produz uma relação autêntica do músico com sua arte. A partir do encontro entre digital e acústico, o duo aloja essa criação em um lugar misterioso, não apenas pela junção de instrumentos, mas especialmente por suas interações com o ambiente. A “bruxaria” não está apenas no nome: está no feitiço conjurado em uma sessão musical livre acompanhada da natureza.

(Bru._.Jo em uma faixa: “Granulares Matinais”)

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ARTISTA: Bru._.Jo

Autor:

Produtor, pesquisador musical e entusiasta de um bom lounge chique