Rosali é uma musicista americana que, depois do sucesso de seu álbum No Medium (2021), lança agora este que é o quarto exemplar de sua carreira. Bite Down, promovido pelo selo Merge Records, é um disco de rock inspirado por clássicos dos anos 1960. O sotaque predominante por aqui é do estilo Americana, que empresta do country e do folk os seus trejeitos mais conhecidos. O estilingue da guitarra, o contrabaixo seco e resoluto, e a voz límpida e oscilante de Rosali unem seus poderes para compor uma banda de coração partido que confidencia segredos indizíveis por meio de canções douradas.
O músico Dan Bejar, da banda Destroyer, escreveu que Bite Down apresenta músicas que constantemente nos desarmam com sua intimidade: “são composições que anseiam por uma sensação de paz e que querem romance, mas são tocadas de forma selvagem – a incrível calma lírica que é a voz de Rosali acima da fúria da banda”.
Essa dualidade interessante é reconhecida também pela própria Rosali, que vê Bite Down como algo multidimensional, situado na encruzilhada entre a “compositora” e a “guitarrista esquisita” que ela é. De fato Rosali, uma musicista com vários projetos paralelos morde, mastiga e apresenta tudo devidamente digerido neste projeto que leva o seu nome próprio. Um ótimo exemplo deste álbum é a faixa “Hills on Fire”, na qual um eloquente solo de guitarra, simples, temperamental e estranho, diz tudo o que precisa apenas cominflexões das notas doloridas.
A capa, ótima, mostra Rosali escondida sob uma folhagem, arregalando os olhos patologicamente, de dentes à mostra num sorriso enlouquecido, como se estivesse à beira de um ataque de nervos. Já o título faz referência ao ato de ficar com o problema, ou seja, de se encarar uma realidade difícil, um fim de relacionamento ou coisa que o valha, e enfrentar a dor, engoli-la.
Na parte da produção, fica claro que este é um disco de banda. Em Bite Down, Rosali é acompanhada pelos membros da David Nance Group, os mesmos que a ciceronearam no álbum anterior, o que dá a este trabalho uma ideia de continuidade em uma mesma pesquisa musical. A inspiração parece ser o rock clássico, em que as composições exibem tons de Fleetwood Mac (ouça “Hopeless”), Velvet Underground (“May It Be on Offer) e até mesmo de outros poetas da música como Silver Jews (“Slow Pain”). Em Bite Down, uma voz muito humana e sem ornamentos se expressa com raiva, mas ao mesmo tempo de modo resignado, em composições dignas de uma estação de rádio dos anos 1960.
(Bite Down em uma faixa: “Rewind”)