Keeper of the Shepherd – se não o disco, pelo menos sua faixa-título –- figura entre os momentos musicais mais bonitos deste começo de 2024. Em seu quarto álbum, a estadunidense Hannah Frances consegue desenvolver melodias agradáveis, pequenas surpresas de produção e uma interpretação à flor da pele para nos apresentar um trabalho tão sensível quanto maduro.
De volta à canção que nomeia a obra, seu desenvolvimento lento contrasta com um ritmo tão bem demarcado. Por cerca de seis minutos e meio, Hannah canta sobre não se perder nas relações, sobre saber quem se é para poder estar com o outro: “I cannot love you without me, I cannot be without me”, como diz o refrão. A intensidade crescente deságua em um caos de ares jazzísticos, com direito a um saxofone que embeleza a dissonância.
É um bom exemplo de como a cantora e compositora, que também assina a coprodução do disco, trabalha esse repertório, com base em violões folk e uma ambientação rural bastante diferente de sua Chicago. Isso está nas referências musicais, mas também nas imagens evocadas em sua poesia e toda a comunicação visual da obra.
De Laura Marling a Feist, passando pela lendária Joni Mitchell, são muitas as (boas) comparações que podem ser feitas ao longo da audição. A crueza da balada “Husk”, a potência das guitarras em “Bronwyn”, à la PJ Harvey, e o indie contemplativo de “Haunted Landscape, Echoing Cave” mostram não só a versatilidade de Hannah Frances, mas como ela faz por merecer seu lugar entre os nomes mais interessantes de hoje, não só no universo folk.
A audição de Keeper of the Shepherd nos coloca nesse estado de reverência pelo que a artista consegue realizar na obra, em termos de composição e produção – mas nos encanta ainda mais por como isso é feito de forma tão sensível, vulnerável e, enfim, humana.
(Keeper of the Shepherd em uma faixa: “Keeper of the Shepherd”)