Resenhas

Taxidermia – Vera Cruz Island

Disco da parceria entre Jadsa e João Milet Meirelles borra a barreira entre orgânico e eletrônico – e consegue, ao mesmo tempo, ser sintético e abrangente

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Ano: 2024
Selo: Independente
# Faixas: 11
Estilos: Art Rock, MPB Experimental
Duração: 24'
Produção: João Milet Meireles e Jadsa

A Ilha de Vera Cruz é não apenas a locação onde se passa Vera Cruz Island, mas um personagem da narrativa criada por Jadsa e João Milet Meirelles no primeiro disco do projeto Taxidermia. A ilha, localizada na Bahia, é o substrato narrativo do duo – e, mais especificamente, a Praia da Conceição, que aparece a todo momento pelas letras. A geografia, o povo a energia do lugar pintam os versos do repertório.

Desde sua gênese (com dois EPs lançados entre 2021 e 2022), a dupla tem como principal característica a união entre a forma única de Jadsa compor e o poder de produção de João em perverter (ou taxidermizar, como gostam de falar) essas músicas. Aqui, essa união borra a barreira entre orgânico e eletrônico, resultando em um álbum que pode fluir do dub ao funk, do house à MPB, sem que isso soe estranho – afinal, a ilha tem isso e muito mais a oferecer.

Já na faixa de abertura, “PUREZA”, João e Jadsa nos convidam a uma viagem por essa ilha que eles conhecem tão bem. De forma singela, eles nos apresentam alguns dos elementos que ouviremos durante a obra, como a voz manipulada da cantora, instrumentos igualmente trabalhados de forma a quase não sabermos qual sua fonte original, um apuro pelos timbres e sonoridades únicas, além de um cuidado especial com os elementos rítmicos. São camadas que se somam para criar essas faixas, são texturas que se empilham para entregar ao ouvinte uma sensação quase sinestésica de se estar a caminho dessa ilha.

Se na abertura já temos algumas descrições da ilha e de seu povo, em “3 P.M.”, conhecemos um pouco das sensações de estar lá. Somos levados para uma tarde ensolarada à beira-mar por meio de versos (“Lua nova às três horas da tarde / Na ilha de Vera Cruz / Na praia de Conceição / O mar invade minha carne”) que daqui para frente vão surgir e ressurgir de forma snovas e inusitadas. “CLARÃO AZUL” também nos revela mais dessa bela paisagem em contornos MPBísticos no que talvez seja a música mais meditativa dentro da obra. Contraste completo com a distópica “SANGUE FERVENDO”, versão taxidermizada para o funk paulistano. Acompanhados de Vírus e Vuto, a dupla mostra a face mais caótica, barulhenta e política dessa ilha.

“GLASS EYE” desacelera o disco numa espécie de adeus – ou melhor, um “até logo” dado o alto valor de replay num disco tão cheio de pequenos detalhes. O incrível deste álbum é que toda essa viagem dura apenas 24 minutos. Viajamos por esse pequeno arquipélago baiano, ouvimos histórias de sua população e vivências dos próprios membros do duo, além de experimentar “MIL SENSATIONS” em tão pouco tempo. O poder de síntese e, ao mesmo tempo, de abrangência é o que torna esse projeto tão único e interessante.

(Vera Cruz Island em uma faixa: “CLARÃO AZUL”)

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BOM PARA QUEM OUVE: Jadsa
ARTISTA: Taxidermia

Autor:

Apaixonado por música e entusiasta no mundo dos podcasts