Tudo o que sei – ou o que se sabe – sobre Ugly é que a banda, natural de Cambridge, é formada por seis pessoas: Samuel, Harrison, Jasmine, Harry, Tom e Theo. Todas sem sobrenome, conforme listados no site da banda. Entre os poucos vídeos disponíveis no YouTube sobre a empreitada, um é gravado por alguém num “iPhone quebrado” e outro é uma apresentação em alguma “secret London location“, que não sei se é apenas o nome de algum estabelecimento ou se de fato configura um evento secreto.
O mistério denota uma banda no início de uma jornada profissional, ainda sem vestígios online, em fase de construção de portfólio – com o perdão da terminologia empresarial. No entanto, a impenetrabilidade parece ajudar o clima obscuro deste Twice Around the Sun, primeiro EP do grupo. Para começo de conversa, chamar esse compilado de EP é apenas uma questão de desejo e abstração da própria banda, já que o disco, apesar de possuir apenas seis faixas, é uma tour de force de 36 minutos de duração, músicas que chegam aos oito minutos, com pequenos épicos e óperas-rock de bolso. Mesmo breve, Twice Around the Sun nos deixa com os ouvidos cheios e com uma sensação de complexidade, envergadura e disposição.
Em Twice Around the Sun, ouvimos coros de vozes aquecidas, instrumentações orquestrais e solos de guitarra em músicas carregadas de massa sonora, que subitamente são intercaladas com espaços vazios e melancolia. Na capa do trabalho, vemos uma colcha de retalhos, o que metaforiza o espírito da banda, algo de cultura popular e de uma vida comunitária, que poderia simplesmente ser traduzido como “folk music”. Twice Around the Sun parece fazer parte de um movimento contemporâneo de bandas com muitos integrantes, músicas temperamentais e arranjos ornamentados, tal qual caroline, Black Midi ou Black Country, New Road. A veia estética do grupo caminha entre o art rock e o indie, feito por jovens rebeldes, mas que também são ironicamente virtuosos em seus instrumentos.
No entanto, apesar das letras sarcásticas, trocadilhos e trava-línguas ditos de canto de boca, Twice Around The Sun evoca os grandes em sua ambição: Queen, Fleetwood Mac, Can e assim por diante. A sensação é que não se trata apenas de nostalgia, mas sim de referências que alcançam longe. No fim, paira no ar a sensação de que o mistério que circunscreve os autores destas faixas, que é o que os dá cacife, em breve vai ser dissipado, porque a banda parece destinada a alcançar muitos ouvidos atentos.
(Twice Around the Sun em uma faixa: “The Wheel”)
