Resenhas

Corinne Bailey Rae – The Heart Speaks In Whispers

Disco bem produzido não fará cantora deslanchar de vez

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Ano: 2016
Selo: Caroline
# Faixas: 12
Estilos: Soul, R&B, Pop Alternativo
Duração: 55:32
Nota: 3.0
Produção: Steve Brown e Corinne Bailey Rae

Corinne Bailey Rae é bonita, simpática e tem uma boa voz. Qual é o seu problema, então? Simples, ela simplesmente não deslancha como cantora. Seus discos são bem produzidos, por ela e pelo maridão, Steve Brown, com cuidados, bom gosto e boas sacadas. As composições, escritas por ela são ok, ainda que ela não tenha conseguido nenhum outro hit mundial além da infecciosa Put Your Records On, do seu álbum homônimo de estreia, lançado há longos 9 anos. Agora, passado este tempo e tendo lançado apenas mais um disco, The Sea, em 2010, Corinne retorna exatamente da mesma forma e com a “desvantagem” de enfrentar hoje a concorrência de uma artista mais completa e visionária que ela, a excelente Lianne La Havas. Vamos destrinchar este The Hearts Speaks In Whispers para ver do que se trata.

Em primeiro lugar, trata-se de um álbum um tanto quanto lento. Não que todas as canções sejam em andamento arrastado, mas ele é arrastado e, como Corinne, não deslancha, ainda que prometa algumas coisas interessantes. Dá pra notar que a voz da moça segue bem, com um timbre anômalo – para o bem – que conjura certa fragilidade infantil com drama, combinação difícil e eficiente às vezes. O instrumental é todo bem cuidado, apostando na mistura de timbres acústicos elegantes com turbinamento de intenvenções sutis de Eletrônica e recursos tecladeiros e efeitos sofisticados. Neste ponto, façamos uma saudação para o casal Bailey Rae, que entende a demanda do mercado para Corinne, a de ser uma cantora “elegante”, com certa classe, algo que não lhe permite cair na farra, soltar a franga, se deixar arrebatar por algo. Essa regra é confirmada ao longo do percurso de doze canções, algumas boas, outras com gosto de biscoito (ou bolacha, dependendo de onde você esteja) água e sal.

O single Tell Me é um exemplo disso. Arranjo eletrônico que dialoga com um núcleo instrumental “vivo”, permitindo que Corinne faça evoluções e malabarismos na base do “vai, é contigo, garota!”. Ela ela não evolui, ainda que o invólucro instrumental seja quase primoroso, inclusive com um sensual apelo para a dança. Nas mãos de outra cantora, certamente seria uma faixa para se lembrar sempre. O outro single, Been To The Moon, também na base da mistura eletroacústica, se sai melhor, com brincadeiras de esconde-esconde com timbres e texturas, deixando um espaço para inflexões com o Soul Pop dos anos 1970, sutil, malemolente. Novamente, Corinne não aproveita a chance para encarnar alguma diva cantante mais intensa e aproveitar melhor a passarela que se apresenta diante dela.

A esperança maior do álbum apresentar algo sensivelmente legal viria do espírito que permeia estas duas canções, ou seja, essa insinuação para composições mais dançantes e arejas, ou, pelo menos uma quantidade maior delas pelo disco. O que se ouve/vê, no entanto, é uma profusão de baladas meio insossas, meio qualquer coisa. Stop Where You Are é bom exemplo, ainda que haja alguma surpresa guitarrística em algum ponto do refrão, ela é chata e sem qualquer alma. Exceção que confirma este medo de ser mais intensa está na boa Green Aphrodisiac, que evoca novamente a matriz setentista de balada Soul Pop de FM, lembrando algo que poderia ser feito por Minnie Ripperton ou alguma outra do gênero. Quando quer fazer algo mais suingado e insinuante, como em Horse Print Dress, Corinne não consegue chegar no terreno da sensualidade – algo necessário aqui – soando aguda demais, fadinha demais.

Vejam, Corinne Bailey Rae tem um enorme potencial vocal. É quase palpável a noção de que ela é capaz de fazer algo bem melhor que seus três primeiros álbuns, mas essa coisa de paciência, compreensão e benevolência não rima com esta nossa tarefa de analisar discos e canções. Mesmo assim, a cotação serve como prova de que, se tudo der certo e alguém conversar com a moça sobre intensidade e música negra, quem sabe o próximo trabalho não chega para redimí-la do que fez até agora? Ainda seguimos com certa confiança da sua capacidade, Corinne, mas, a cada lançamento sem glúten que você faz, fica difícil, viu? Bastante.

(The Heart Speaks in Whispers em uma faixa: Tell Me)

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.