Resenhas

Neko Case – Hell On

Cantora entra para o time das grandes artistas de sua geração

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Ano: 2018
Selo: Anti
# Faixas: 12
Estilos: Rock Alternativo, Folk Alternativo
Duração: 52:44
Nota: 4.5
Produção: Neko Case

“Quem conhece Neko Case, gosta de Neko Case.” Parece bordão de candidato a algum cargo público em tempo de eleição, mas eu lhes asseguro que não é. Ela é mais uma daquelas artistas que reune predicados mil – boa voz, ótima compositora, senso melódico e diversidade de pensamentos – e segue restrita a um público que poderia ser muito maior. Claro, vivemos num tempo de escalonamento de audiências e, de 100 pessoas que passarem na esquina de uma rua na Zona Sul do Rio, talvez apenas uma a conheça. Ou nem isso. Felizmente – e paradoxalmente – tal fato não impede que artistas como Neko sigam em atividade fazendo ótimos trabalhos. Este Hell On é um de seus melhores álbuns.

Misturando uma musicalidade tangente ao que se chamava de Alt. Country com uma contemporaneidade inegável e um ar impregnado de aromas e detalhes de um Estados Unidos que não chega até nós pela mídia, Case ergue mais um painel de sentimentos e sensações, com instrumental que alterna a simplicidade de voz e violão com arranjos de banda completa e até participações de metais e cordas, tudo muito bonito e bem feito, com a produção dela mesma. É o caso daquele ponta que cobra o escanteio e corre pra área a fim de tentar a cabeçada para o gol adversário. O que chama a atenção, no entanto, é a majestade das canções, não só muito bem gravadas como belezuras da ourivesaria de composição destes nossos tempos. É como se Fleetwood Mac no auge do sucesso setentista embarcasse numa viagem no Túnel do Tempo e saísse em 2018 com a missão de fazer um disco. Que baita elogio, Neko.

Há momentos dourados ao longo das doze faixas e a brincadeira já começa logo na abertura, com uma pequena e enigmática valsa que leva o título do disco. É na segunda canção, Last Lion Of Albion que a certeza de estar diante de uma pequena obra prima chega de forma inequívoca. Refrão contagiante, instrumental exuberante e soluções melódicas simples e cativantes. A partir daí, com o coração ganho e sendo embalado pelas mãos hábeis da cantora, dá pra seguir viagem pelo álbum adentro. Halls Of Sarah é sombria como uma tarde de céu nublado, mas que pode ser perfeita para quem estava cansado de sol e céu azul. Tem beleza fora dos parâmetros e pode cativar até os admiradores do tempo limpo com seus sutis teclados, saxofones e melodia linda. Bad Luck tem potencial para entrar em qualquer lista de melhores canções de 2018, com seu inegável pedigree pop que explode em melodia perfeita e refrão sob medida.

Quando pensamos que Case irá nos levar por um álbum eminentemente pop, surge um épico country-prog chamado Curse Of The I-5 Corridor, com sete minutos de duração e participação de Mark Lanegan nos vocais, conferindo o tom de mistério e esquisitice para que nos concentremos em todos os detalhes que estão no disco. Também há o Rock em câmera lenta de Gumball Blue, ecos de Rickie Lee Jones na beleza discreta de Dirty Diamond e certo misticismo elemental em Oracle Of The Maritimes, que evoca paisagens de praias desertas e definitivas. O tema marinho volta com a confessional My Uncle’s Navy, que poderia ser uma bela canção de gente como 10000 Maniacs. Pitch Of Honey fecha os trabalhos com mais um arranjo discreto e enigmático que evolui para uma popice deslavada e sensacional.

Talvez ninguém tenha percebido o crescimento de Neko Case como artista ao longo dos anos, evoluiondo de “aquela menina da banda The New Pornographers” para alguém com força suficiente para pisar com os próprios pés. Se ela já havia atingido esse status há tempos, com este álbum ela entra para o time das grandes cantoras norte-americanas de sua geração. Um baita dum disco.

*(Hell On em uma música: Last Lion Of Albion)**

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BOM PARA QUEM OUVE: Bryan Adams, Jenny Lewis, Wilco
ARTISTA: Neko Case

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.