Resenhas

Dry Cleaning – Stumpwork

Embora com a essência da prestigiada estreia, segundo disco do grupo britânico amplia possibilidades de seu pós-punk e é um passo refinado e mais distante da atual “cena”

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Ano: 2022
Selo: 4AD
# Faixas: 11
Estilos: Indie Rock, Pós-Punk
Duração: 45'
Produção: John Parish

Com o sugestivo nome “Anna Calls From the Arctic”, o quarteto londrino Dry Cleaning, formado por Florence Shaw (vocal), Lewis Maynard (baixo), Nick Buxton (bateria) e Tom Dowse (guitarra) dá o pontapé inicial em Stumpwork, que sucede a recente e celebrada estreia New Long Leg (2021). A faixa é a abertura perfeita para uma coleção de músicas de tons metálicos e auras em que o surreal e o mundano se conflitam. Ouvir as 11 faixas gera um desconforto, mas que encontra pequenos alívios, como pisar em azulejos gelados – em um dia frio (“Icebergs”) ou em dias de sol (“Gary Ashby”). E o tenso momento político que o Reino Unido atravessa respinga também nas composições, como na excelente “Conservative Hell”.

O Dry Cleaning teve uma trajetória diferente das bandas que formam a recente “cena” de Londres. Foram dois EPs – Sweet Princess e Boundary Road Snacks and Drinks (2019) –, até que a estreia com um disco cheio teve seu percurso natural interrompido pela pandemia. Eles não tiveram a chance de engatar uma longa turnê, sentir a resposta do público e assimilar experiências para que servissem de combustível para novas canções. Não que a banda precisasse disso. Com New Long Leg lançado, canções como a ótima “Don’t Press Me”, carro-chefe de Stumpwork, já tinham sido escritas – com ou sem a resposta do público em relação ao debut. O produtor John Parish foi novamente o escolhido para guiá-los pelo lendário Rockfield Studios e, dessa vez, com o dobro de tempo no estúdio.

A sensação de desconforto já é gerada pela capa – entre as mais interessantes do ano. Com assinatura de Rottingdean Bazaar e Annie Collinge, a imagem mostra pelos pubianos como um bordado num sabonete que faz a vez de tecido. Para além da repulsa imediata, a figura parece despertar uma conexão por um viés demasiadamente humano – é uma cena tão desconfortável, quanto mundana. (E vale mencionar que o termo stumpwork é usado para descrever um estilo de bordado em relevo, popular na Inglaterra entre 1650 e 1700).

No som, não é o caso de ser um álbum experimental, mas, se comparado ao que já foi apresentado pela banda, pode se dizer que Stumpwork coloca para jogo novos instrumentos, novas texturas e, principalmente, inaugura dinâmicas entre os integrantes. Eles soam mais alinhados a um conceito – o que pode ter sido resultado de mais tempo de estúdio, promovendo mais química e confiança mútua.

Aqui não existe a urgência que os guiava na maior parte de New Long Leg, como nas brilhantes “Scratchcard Lanyard” ou “Her Hippo” (uma das faixas de 2021 aqui no Monkeybuzz). O espírito de jam  entre amigos não é tão presente, ainda que a psicodelia atordoada de “A.L.C” e “Every Day Carry”, as duas últimas do repertório anterior, ainda permaneçam. E é esse refinamento tanto estético quanto sonoro que distancia o Dry Cleaning do balaio de bandas atuais do pós-punk britânico, onde ela acabou sendo colocada. Faz mais sentido falar de um quarteto de rock. Ou, vá lá, se for para nichar, que seja então art rock.

Stumpwork é recheado de canções que ressoam o rock alternativo do Pavement, o jangle pop do The Feelies ou o rock experimental do Sonic Youth. Mas o Dry Cleaning, ainda assim, não soa como ninguém. É um passo refinado com relação à estreia – e que os afasta da atual leva do pós-punk britânico – e um trabalho que, nas entrelinhas, parece cheio de dor. Mas que nasce da busca por motivos que nos fazem seguir.

(Stumpwork em uma faixa: “Liberty Log”)

 

  • Esse texto é dedicado ao meu amado pai José Augusto, conhecido por Tuto, que não deixava de ler uma matéria minha. Espero que goste dessa, pai. Te amo sempre. – Isadora

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ARTISTA: Dry Cleaning