Resenhas

Jamaica – Ventura

Evocando referências que vão de Phoenix a The Strokes, disco do duo se mostra divertido

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Ano: 2014
Selo: Relativity
# Faixas: 12
Estilos: Alternativo, Indiepop, Electrorock
Duração: 43:57
Nota: 3.5
Produção: Peter J. France, Laurent D'Herbécourt

Se você coleciona duos franceses que produzem música com um pé no passado e outro no futuro, separe mais espaço no seu coração para Jamaica. Não que seus formadores e cérebros pensantes sejam exatamente originais, mas Antoine Hilaire (vocais e guitarra) e Flo Lyonnet (baixo, vocais) tem aquela tara absoluta pelos anos 1980, sua cultura, sua música e como as coisas costumavam ser naquele tempo distante. Assim como os outros integrantes das outras duplas francesas, Hilaire e Lyonnet também foram afetados totalmente pelas ondas de músicas, filmes, programas de TV e seriados que vinham dos Estados Unidos como manifestação cultural/release de um american way of life aperfeiçoado e irresistível. O resultado está por todos os cantos deste segundo disco do Jamaica, Ventura. A capa já entrega o clima do álbum: os dois à frente de um Cessna bimotor e um arsenal de guitarras, baixos e amplificadores, como se apresentassem suas credenciais ao ouvinte, na base do “estamos aqui e vamos te conquistar”.

Não dá pra ignorar a influência de Phoenix inicial neste segundo trabalho do Jamaica. O clima é de Rock sintetizado, Pop macio e com fator temporal voltado para 1982, 1983, se muito. Se Phoenix conseguiu partir desse ponto e encontrar seu próprio som lá pelo terceiro disco, a trajetória do Jamaica recebe contornos encorajadores, até porque eles ainda não parecem muito próximos de uma sonoridade peculiar. Alguns setores da imprensa gringa enxergaram semelhanças entre Jamaica e The Strokes, algo que este velho resenhista, um sobrevivente dos anos 80, não detectou. Os sujeitos, no entanto, não são apenas revisionistas, trazem alguma centelha de modernidade e chamaram Tunde Adebimpe, o homem por trás do TV On The Radio, para participar do disco. Há muita canção assoviável e oscilando entre a crocância e a fofura.

O primeiro single, Two On Two, abre o disco com uma levada de guitarra que pode ser uma cruza de Faith, canção de 1987 de George Michael e uma bateria sintética e Pós Punk oitentista, fonte de inspiração para os próprios Strokes, talvez daí venha a confusão dos veículos gringos sobre a influência da banda de Julian Casablancas no grupo. Guitarrinhas dão o tom de sensibilidade Pop à moda antiga. Hello Again, homônima de uma canção dos Cars de 1984, traz batida rápida, guitarrinhas subterrâneas e um clima New Wave que poderia lembrar algo como um Billy Idol sem a pose apocalíptica. A guitarra acústica novamente parece chupinhar Faith, mas a levada cadenciada toma conta de Houdini, canção linear e simpática que é sucedida por Golden Times, cheia de teores light de Synthpop e um refrão que parece sequestrado das paradas de sucesso de 1985. All Inclusive tem alguma coisa de Police, mas logo a impressão some numa massa sonora que reproduz várias nuances oitentistas. A faixa seguinte, Ferris Wheeler (citação evidente a Ferris Bueller, antológico personagem de Matthew Broderick em Curtindo A Vida Adoidado) é outra representante digna da sonoridade Pop da época, trazendo algo de Mike And The Mechanics em sua levada cadenciada.

Higher Than Low é uma tentativa de reproduzir sonoridades um pouco mais Rock mas a gloriosa progressão de teclados que inicia Ricky, a faixa seguinte, é uma maravilha de “dejá ouvi”, lembrando aquelas formações solenes e tecladeiras dos 80’s, mas Jamaica toma o cuidado necessário para que a homenagem não seja excessiva. Consegue. Rushmore vem em seguida e traz um atestado de intenções bem maior que as guitarras, baixos, pose e tudo mais da capa: Jamaica sabe fazer uma balada lentinha e simpática, aspirante ao dourado set de canções que rolavam nas festinhas de playground na Hora da Música Lentinha, quando os pobres meninos tentavam tirar as meninas para dançar. Aqui vai um porém: a civilização ocidental começou a ruir quando as músicas lentas se tornaram artigo em extinção. Um dia vocês vão me dar razão. Turbo parece trilha sonora de videogame, é barulhenta e invocada na medida certa e não tem cara de anos 80 e dá espaço a Same Smile, outra música feita em laboratório para se assemelhar a algo feito por The Alarm ou algo assim. Goodbye Friday tem guitarras crocantes e levada aerodinâmica, novamente ideal para uma daquelas danças com pulinhos tão típica da época.

Jamaica é uma aposta com pouco risco. Os sujeitos têm sensibilidade Pop, inteligência musical para escaparem dos chavões musicais da década de 1980 e boas intenções. Ventura é um belo catálogo de sonoridades e nuances de um tempo fascinante para quem nasceu depois e familiar para quem começou a ouvir música pop na época. De qualquer forma, Hilaire e Lyonnet fazem boa música Pop, ou seja, tudo o que aspiram fazer.

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BOM PARA QUEM OUVE: Phoenix, Air, Daft Punk
ARTISTA: Jamaica

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.