Resenhas

Laura Veirs – My Echo

11º disco da cantora americana tem divórcio como pano de fundo e cativa pelo tom sensível e realista

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Ano: 2020
Selo: Raven Marching Band/Bella Union
# Faixas: 10
Estilos: Folk, Indie
Duração: 33'
Produção: Tucker Martine

Chegar à marca dos 11 álbuns lançados não é para qualquer artista, ainda mais no meio independente. Além das dificuldades práticas, logísticas mesmo, de se manter em atividade por tanto tempo, e com tamanha produção, há a questão criativa em si – não é nada simples encontrar inspiração para compor músicas que tenham significado, e mais desafiador ainda é fazer isso de forma interessante. Laura Veirs foi sábia ao construir uma carreira que, ao longo de 20 anos, dialogou com a herança de uma grande tradição autoral de compositores que encontram material para suas letras e arranjos a partir de si mesmos.

Nessa dinâmica, My Echo chega como um dos mais íntimos dos 11 volumes em sua discografia – que contém ainda o colaborativo case/lang/veirs, feito ao lado de Neko Case e k.d. lang. O álbum reúne composições feitas a partir da constatação de que seu casamento havia chegado ao fim, um processo que se estendeu por um bom tempo até todas as fichas caírem e as decisões serem feitas. Mais do que cantar sobre a amargura de viver um matrimônio separado antes da morte, Laura trouxe o olhar esperançoso de quem nota a vida em um novo momento, causado pelo alívio de ver uma situação negativa ser resolvida e finalmente deixada para trás.

Sendo assim, o clima do disco pode ser muito bem descrito pelo uso do clichê da luz do sol por entre as nuvens após a chuva, ou por como as plantas florescem após a geada. Já na abertura, ela canta sobre um período de busca mental constante por sentir-se livre (em “Freedom Feeling”), em referência ao tempo em que não entendia que seu casamento já havia terminado, mas, ao contrário do desgosto que se imaginaria de uma música dessas, há uma punção de vida latente em sua voz. Isso se estende ao longo de todo álbum e se concretiza ainda mais no refrão “Ooh I was glad to be alive” em “Memaloose Island”.

Isso não quer dizer, é claro, que My Echo seja uma obra feliz em sua essência. As letras dão conta de traduzir alguns dos sentimentos de Laura durante o divórcio, que ela explica como “viver o fim dos tempos” (e faz um belíssimo testamento a um amor maior que o rótulo do casamento em “End Times” e seu tão peculiar quanto melancólico refrão “When I think of the end times, you come to mind”). Distante dos maneirismos que causam comoções fáceis, a artista escolhe trabalhar a complexidade das emoções em uma situação dessas, dialogando com a confusão que todos nós conhecemos bem nessa atividade que é ser humano.

É curioso pensar que My Echo tenha sido lançado em meio a uma pandemia e a uma semana das eleições mais acirradas e quentes da história dos Estados Unidos. O projeto chega com músicas sobre como é atravessar o tal fim dos tempos e estar contente por ter sobrevivido. É o encorajamento sensível e, ao mesmo tempo, realista que precisamos. Por qualidades assim, Laura Veirs merece uma carreira de grande longevidade, com mais discos que, assim como este, nos cativam em um nível bastante pessoal enquanto nos deslumbram também por sua beleza.

(My Echo em uma faixa: “End Times”)

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ARTISTA: Laura Veirs

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.