Resenhas

Smerz – Believer

Escorado em referências artísticas que extrapolam a música, duo norueguês brinca com expectativas e lacunas em disco de estreia embalado por “Indie cerebral”

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Ano: 2021
Selo: XL Recordings
# Faixas: 16
Estilos: Indie, Eletrônica
Duração: 42'

Smerz é item de museu. Não digo isso dentro do lugar comum do termo, como se seu trabalho fosse tão precioso que precisasse ser validado pelas instituições e guardado para as futuras gerações em um prédio – nem, claro, que soe obsoleto. É um item de museu porque o duo norueguês possui um trabalho audiovisual que já excursionou por diferentes espaços artísticos do mundo, como o Tate Modern, em Nova York. E essa vivência é palpável em Believer, seu primeiro álbum.

É um projeto que, diferente dos lançamentos com os quais divide espaço nas plataformas de streaming, exige do ouvinte o comprometimento de tempo, envolvimento e interpretação. Da mesma forma com que não se aprecia uma exposição andando e olhando de relance para as obras, ou como não se pode sentar em um teatro ou cinema e apertar fast forward no que está sendo exibido.

Believer começa com o som agudo do carrilhão que, após mais de 40 segundos, recebe a interferência da guitarra que domina o espectro sonoro da faixa com seu grave – não à toa, a música se chama “Guitarrif”. Ela serve como introdução a “Max”, que recebe vocais e esporádicos timbres, alguns bastante volumosos, sem nunca perder seu caráter cheio de lacunas.

Essa sensação impera ao longo do disco, a de que “falta alguma coisa”. Seja porque o disco conta com seu acompanhamento visual para ser uma obra completa, ou porque quer provocar o ouvinte a preencher seus espaços com aquilo que carrega em si, seu repertório e sua visão de mundo (ou mesmo a perspectiva do que uma canção ou álbum deveria ser). São questões comuns à arte contemporânea e que, vez ou outra, influenciam esta cena Indie mais cerebral, distante da espontaneidade às vezes ingênua das bandas propriamente ditas.

A narrativa de Believer se baseia também em algumas quebras de expectativa, como se dissesse ao ouvinte que o álbum ainda não foi completamente entendido. Por isso, há faixas como “Flashing”, que brinca com nosso imaginário de esperar que ela se desenvolva em algo dançante, ou a agressiva “Hester”, que desenvolve grande volume até acabar em mais uma daquelas já mencionadas lacunas de som.

Há um breve Rap (ou intenção de fazer um Rap) antes do fim, ao lado de várias faixas curtinhas, quase vinhetas, que exploram sonoridades em arranjos que harmonizam com as demais músicas, como se esse alcance harmônico fosse a paleta de cores da obra. E Believer tem mesmo uma “cara” muito própria, que dialoga também com os dois elementos que compõem sua capa, ocupando a maior parte do quadro, embora o preto do fundo seja talvez o que mais fique na memória.

Da mesma forma, Smerz trabalha aqui uma música baseada no “escuro”, no que não se ouve, por mais reluzentes que os timbres sejam. Em meio a esse repertório, o duo ainda oferece – e, penso eu, com um sorrisinho irônico – a faixa-título em um formato mais próximo de canção, em um flerte com o lado mais sombrio do Trip Hop, e “I Don’t Talk About That Much”, diálogo direto com o que Grimes e outras mulheres de grandes intenções artísticas nos ofereceram nos últimos anos. Não à toa, talvez seja essa a expectativa que a dupla espera que tenhamos a partir de nosso repertório se chegarmos ao seu trabalho esperando meramente música.

(Believer em uma faixa: “Rain”)

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ARTISTA: Smerz

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.