Resenhas

The Smile – Wall of Eyes

Novo disco do projeto de Yorke e Greenwood é menos “grandioso” do que o antecessor, mas mantém a intensidade em meio ao inescapável “sotaque radioheadiano”

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Ano: 2024
Selo: Self Help Tapes/XL Recordings
# Faixas: 8
Estilos: Rock Alternativo, Indie, Pós-Punk
Duração: 45'
Produção: Sam Petts-Davies

É possível dissociar The Smile de Radiohead? Entendo que essa argumentação parece mais natural a um primeiro álbum – e foi o caso em A Light for Attracting Attention. Mas, ano e meio depois, o fato dela guiar nossa audição do segundo disco, Wall of Eyes, é mais uma em meio a tantas possíveis provas do quanto o quinteto britânico está firme no imaginário dos ouvintes – seja de quem tem In Rainbows como seu trabalho favorito ou por quem conhece o grupo pela presença de músicas como “Creep” na cultura pop. Seria possível alguém gostar de uma das duas bandas, mas não da outra?

Voltando então ao assunto: Thom Yorke e Jonny Greenwood não representam meros 40% do que forma Radiohead: ambos são referências astronômicas na música contemporânea a partir do que começaram com a banda, mas, em quase 40 anos de carreira, seus nomes carregam um peso imensurável – principalmente ao lembrarmos que os dois formaram muito da sonoridade, ou identidade, do grupo. E o que mais chama a atenção no que fazem com o baterista Tom Skinner em The Smile é a repetição da estética e dos maneirismos de sempre, só que sob uma nova alcunha.

Em Wall of Eyes, tudo é familiar para quem está habituado ao trabalho dos dois. É um “sotaque” repetido na construção dos arranjos, na própria variedade rítmica de uma música para outra e, é claro, na inconfundível interpretação de Yorke. Em comparação com o álbum anterior, fica a sensação de uma obra um pouco “menor”, não só pelo número de faixas (oito, enquanto A Light… trouxe 13), mas também por trazer faixas menos grandiosas, ainda que com a intensidade esperada.

É assim na abertura com a faixa-título e sua levada de bossa, que ganha diversos elementos ao longo de seus cinco minutos – de arranjos de cordas a ruídos dissonantes, passando pela tensão do vocal duplicado fazendo a contagem do ritmo. Sem nunca se exceder, como se pairasse a meio metro do chão sem alçar voo mais alto. É assim também na seguinte, “Teleharmonic”, com um grave aterrado equilibrado pelo timbre agudo de flauta.

Na sequência, “Read the Room” ousa levar o ouvinte a uma distância maior na melancolia e no peso, e alguns de seus momentos são o mais perto que The Smile chega de ser um “power trio”. A faixa abre as portas para uma intensidade maior, repetida nos mais de seis minutos de “Under Our Pillows”, e é inevitável, mais uma vez a lembrança de Radiohead nas guitarras e na ambientação ruidosa e experimental.

Essa identidade é grande parte do que a união de Yorke e Greenwood construiu no imaginário popular: a de uma banda que virou sinônimo de sensibilidade, em paralelo a uma estética desligada dos padrões. Wall of Eyes prolonga essa personalidade dos músicos e de The Smile como um todo. “Friend of a Friend”, não à toa escolhida como single, é mais uma extensão dessas características – ouça como Yorke canta o verso “buried from the waist down” e perceba a familiaridade com que recebemos a música.

Quando o disco encontra o seu clímax absoluto, em “Bending Hectic” (também single, apresentado meses antes do anúncio do álbum), o fã do duo e de sua banda mais conhecida, tanto quanto alguém que chegou a The Smile sem conhecer tanto a discografia que antecede o novo projeto são contemplados com exatamente aquilo que sabiam que escutariam aqui. E a pergunta retorna: seria possível gostar de só uma das duas bandas?

Outra questão que paira sobre The Smile é a justificativa de sua existência enquanto “projeto paralelo”, visto que ele apenas dá continuidade ao que Yorke e Greenwood já desenvolviam com Radiohead. Ao mesmo tempo, soa injusto questionar dois artistas que apresentam um trabalho de tanta qualidade como esse de suas motivações para nos entregar mais músicas como as de Wall of Eyes. No fim das contas, ao se tratar de algo excelente, querer “mais do mesmo” é sempre justificável.

(Wall of Eyes em uma faixa: “Friend of a Friend”)

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BOM PARA QUEM OUVE: The Smile

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.