Resenhas

Kimbra – A Reckoning

Entre o pop e o experimental, quarto disco da cantora neozelandesa coloca a técnica a serviço da poesia

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Ano: 2023
Selo: Independente
# Faixas: 10
Estilos: Indie, Pop
Duração: 40'
Produção: Kimbra, Ryan Lott, BRUX, Chris Tabron, Felix Snow e Timon Martin

Acompanhar a carreira de Kimbra dá ao ouvinte duas constantes certezas. A primeira é a de nunca saber ao certo como será seu próximo trabalho. E a outra é poder afirmar com tranquilidade que ele será excelente. É o que o público confirma em A Reckoning, uma obra que carrega a originalidade e aquele quê de bom entretenimento dos lançamentos anteriores da artista, agora sob uma carga autoral ainda maior.

A abertura com “save me”, não por acaso também o primeiro single do álbum, introduz o público ao universo estético da obra. São caminhos emprestados do pop de cunho mais experimental e do indie mais, digamos, pop, em ambientação um tanto minimalista que contrasta com a explosão de cores e texturas de outros momentos de sua carreira.

Desta vez, Kimbra explora outras nuances de sua voz, em interpretações de menor intensidade, às vezes quase sussurradas. É um recurso de estilo que nos ajuda a entender também o quanto a obra é intimista, tratando de temas talvez ainda mais pessoais que os que ela expôs no passado.

De todo o repertório, além de “save me”, “foolish thinking” se destaca pela maneira como trabalha o equilíbrio entre o silêncio, os timbres suaves e um grau muito simpático de experimentação para receber versos sobre a parentalidade projetada – como Kimbra explicou, é uma canção feita para seu “future human” (ou seja, um filho que terá no futuro). Ryan Lott (Son Lux), coprodutor do disco, participa da faixa com seu vocal sempre vulnerável, adicionando ainda mais humanidade à obra.

A escolha de Lott para produzir todo A Reckoning ao lado de Kimbra revela muito sobre o que a artista queria para a obra. Ela, que sempre se distanciou com naturalidade do lugar de diva que o Pop gosta de inserir mulheres com seu alcance vocal, coloca mais uma vez sua poesia em primeiro lugar – e poesia aqui é sinônimo do fazer artístico, do realizar criativamente.

Para quem gosta de seu lado mais colorido, várias músicas do álbum têm tudo para serem novas favoritas, mesmo dentro dessa proposta. É o caso de “la type” (com Tommy Raps e Pink Siifu), a deliciosa “the way we were” e “new habit”, talvez a faixa que mais se assemelha ao restante de sua discografia, ao lado das explosivas (ou ao menos “explosivas” dentro do universo de A Reckoning) “gun” e “replay!”.

Cada momento de “A Reckoning” é milimetricamente construído artesanalmente dentro da excelência de sempre com que Kimbra trabalha suas composições e produções. É até engraçado pensar que seu lado técnico de “cantora”, tão intenso e, inclusive, superior ao da grande maioria de vozes que nos chegam todos os dias, fique quase em segundo plano ao analisarmos o álbum com atenção. E isso só argumenta a favor da ótima caixinha de surpresas que é receber mais um de seus lançamentos.

(A Reckoning em uma faixa: “save me”)

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ARTISTA: Kimbra

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.