Resenhas

Real Estate – The Main Thing

Quinto álbum condensa atributos de mais de dez anos de carreira

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Ano: 2020
Selo: Domino
# Faixas: 13
Estilos: Indie, Dream Pop
Duração: 48'
Produção: Kevin McMahon

Há algumas implicâncias que envolvem lançar um quinto álbum na carreira. Ao chegar a este marco, uma banda já teve tempo de sobra para refletir sobre seu som, sua estética e até a respeito do propósito em continuar existindo. Ela já possui também experiência mais do que suficiente para saber o que fica melhor em seus shows, ou até mesmo o que seu público mais gosta em seu trabalho. Não é de se estranhar, portanto, se o quinto lançamento chegar como uma versão aprimorada de sua discografia.

É o tipo de pensamento que vem à mente a cada audição de The Main Thing, que o Real Estate colocou no mundo neste início de 2020. Inserido na linha do tempo, ele mostra como o grupo de Nova Jersey desenvolveu sua musicalidade dentro – mas não somente – de um Indie Pop comares Surf, aquele que influenciou tantas outras bandas desde 2009. Essa proposta aparece aqui em um formato mais maduro, fruto de um processo natural de quem está na estrada há muito tempo: o estilo é cada vez menos relevante frente às composições.

Dito isso, faz sentido, sim, classificar o álbum dentro do rótulo do Indie Pop, mas faz mais sentido ainda observar como o repertório e a narrativa do disco parecem abrir organicamente esse leque. Claramente dividido entre lados A e B, The Main Thing segue a tradição desse formato e entrega de cara aos fãs aquelas faixas que melhor saciam a vontade de “novidades de Real Estate”.

É o caso da abertura “Friday”, da simpática-com-cara-de-hit-indie “Paper Cup” (parceria com Sylvan Esso) e da dupla “You” e, em especial, “Falling Down”, que tranquilamente serviriam de cartão de visita para alguém que quisesse entender o som da banda. Nelas, guitarras e baixo melódicos, a percussão acelerada sem perder a tranquilidade e os vocais sensíveis mostram, mais uma vez, por que acompanhamos o Real Estate já há mais de uma década. Cada música, no entanto, ganha adornos próprios, o que valoriza as produções em níveis mais particulares. É um beat eletrônico aqui (“Gone”), sintetizadores discretos ali (“Friday” e “November”) ou o timbre do piano que dá uma cara atemporal tão simpática para“Falling Down” – sempre há algum pequeno capricho que sabe conferir refinamento às faixas.

O tal lado B, a começar por “Also a But”, é formado apenas por momentos assim. Sai a vibe Pop, fica a melancolia de um Indie autoral que experimenta novas dinâmicas dentro de seus arranjos. Essa faixa, por exemplo, brinca com uma estrutura diferente do “verso e refrão” das anteriores e traz movimentos irregulares, de pouca instrumentação em um segundo e banda completa no seguinte, com direito a solos de guitarra.

É como se o Real Estate dissesse, depois de seis músicas tão gostosinhas, “sabemos que podemos ir além”. Tanto é que a seguinte, a própria “The Main Thing”, pode parecer pertencente ao lado A em uma audição superficial. Porém, a bateria fragmentada e os timbres que são incorporados aos poucos nos relembram que ela se sente mais à vontade no lado “menos Pop” da obra – no qual se destacam também a instrumental “Sting”, a quase Twee “Silent World”, além de “Procession”, que parece ter influências que vão de Weezer a Kurt Vile.

O encerramento com “Brother”, uma breve joia de inspiração Lo-Fi Psicodélica, encapsula bem a atmosfera dessa segunda metade de disco. É o arremate de uma saga viaja do clima solar a um anoitecer melancólico, evocando metáforas frequentes sobre o decorrer da vida. Em sua obra mais madura, o Real Estate explora diferentes regiões do espectro sonoro construído ao longo de toda a carreira. Ao invés de surpresas, optou por entregar ao público tudo aquilo que faz de melhor – e quem gosta da banda não tem motivos para reclamar.

(The Main Thing em uma faixa: “The Main Thing”)

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ARTISTA: Real Estate

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.