Resenhas

Terno Rei – Violeta

Terceiro álbum da banda de São Paulo traz grande mergulho emocional pautado por cenas cotidianas, palavras simples e aqueles arranjos que mais queremos ouvir no Indie hoje em dia

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Ano: 2019
Selo: Balaclava Records
# Faixas: 11
Estilos: Dream Pop, Shoegaze
Nota: 4.5
Produção: Gustavo Schirmer e Amadeu de Marchi

É difícil pensar em um outro cenário para Solidão de Volta que não seja a São Paulo mostrada no clipe. Com ele, Terno Rei estreou o primeiro single de Violeta e abriu as portas para o que encontramos neste que é seu terceiro álbum: Uma melancolia urbana e contemporânea, comum a quem vive em meio à multidão e à paisagem sem horizonte.

Como a primeira faixa (Yoko) logo escancara, há aqui uma grande busca por plenitude difícil de atingir na cidade grande. A letra compara a “simetria tão sem graça” com o querer jogar-se “nesse azul” – “pois aqui me sinto livre, eu aqui me sinto em casa, eu aqui me sinto inteiro” – após narrar trocas de mensagens, discussões e falta de tempo, três temas quase universais em nossa época que muito tem a ver com o ritmo urbano e como as interações se dão no espaço forçadamente compartilhado.

O que começou no videoclipe ganhou mais força no álbum, que traz uma faixa com o próprio nome São Paulo. Ao contrário de Yoko, suas estrofes são pouco lineares, trazendo pequenas ideias e sensações que formam um mosaico da vida na metrópole paulistana, com sua “gentil hostilidade” e o ritmo acelerado. Com um vocal mais cansado, até mesmo fragilizado, a música reflete muito do tom do disco, de uma carga sentimental lapidada pela rigidez do concreto e pela aspereza do asfalto. Em suas cores opacas e calçadas irregulares, SP tem amor sim, só é preciso descobrir como sustentá-lo.

Esse movimento de ir ao encontro do que se sente, de aproveitar a vontade de horizontes maiores para explorar seu interior, tem na individualidade uma de suas maiores influências. Em um ambiente cosmopolita, onde tudo e todos acontecem ao mesmo tempo, seu senso de identidade se baseia às vezes no que é mais seu – suas histórias, seus desejos, suas experiências, sua perspectiva. Daí o “eu” estar no centro de Violeta, expressando ora o desejo de voar, ora o de se esconder. Há um certo desejo pela evasão, e ela acontece também ao criar cenários idealizados (como em Dia Lindo) ou um senso de contemplação de referências saudosas, como os próprios títulos Luzes de Natal, Vento na Cara e Roda Gigante carregam.

Musicalmente, Terno Rei passou pelo mesmo processo do que o eu-lírico. Compartilhando estéticas comuns a bandas não só de São Paulo, mas de Los Angeles, Paris ou qualquer metrópole cosmopolita de hoje, há aqui um desejo natural de encontrar a sonoridade que constrói sua identidade como única em meio a tantas – algo comum também a outros grupos que já possuem dois discos lançados. Com isso, aquele lugar onde o Dream Pop e o Shoegaze conversam foi expandido com influências do Folk Rock e do Post-Punk, além de experimentos com outros timbres (violões e synths, por exemplo).

A banda constrói assim uma narrativa de grande amplitude emocional, sem perder qualquer ternura. Violeta – que pode ser uma flor, a cor do céu cantada em Medo ou o nome de uma mulher – tem sempre uma carga afetuosa em primeiro plano, o que torna sua audição ainda mais prazerosa e envolvente. Ao falar do cotidiano usando palavras simples – seja ao inserir “tosca” em um verso ou a usar a segunda pessoa do pretérito perfeito para rimar “decidiste” com “triste” -, Terno Rei parece firmar-se ainda mais em sua personalidade de uma grande sensibilidade combinada aos arranjos que mais queremos ouvir dentro do Indie hoje em dia. É um diálogo forte com aquilo que curtimos atualmente no circuito alternativo de São Paulo, do Brasil e do mundo, sem nunca perder sua identidade (ou perder-se nela).

(Violeta em uma música: São Paulo)

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ARTISTA: Terno Rei
MARCADORES: Dreampop, Shoegaze

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.